Rastreio de Cozinha - 15
O que os chefs franceses Claude Troisgos e Laurent Suaudeau têm em comum? Ambos vivem no Brasil e são casados com brasileiras. Troigos tem um restaurante, o Olympe (rua Custódio Serrão, nº. 62, Jardim Botânico) e um bistrô, o 66 Bistrô (avenida Alexandre Ferreira, nº. 66, também no Jardim Botânico), ambos no Rio de Janeiro e, ainda, é consultor do Blue Door, no Delano Hotel (1685 Collins Avenue Miami Beach, FL 33139), nos EUA. Suaudeau, que comandou o extinto restaurante Laurent, atualmente está à frente do Espaço Cultural Laurent, que fornece cursos, eventos e consultoria gastronômica. Os dois têm em comum também o fato de estarem conectados ao grande chef francês Paul Bocuse, que revolucionou a cozinha mundial ao criar a nouvelle cuisine, em 1973, uma cozinha moderna com raízes na culinária tradicional.
Mas, e eu já disse aqui neste espaço, a gastronomia é como a moda e, a cada temporada, surgem novos chefs, novas idéias e interpretações que, como as camadas de cebola, sobrepõem-se umas às outras e, de nouvelle passam a antique. Bocuse, na gastronomia atual, é visto como datado e suas idéias soam ultrapassadas quando comparadas ao frescor do chef catalão Ferran Adrià e à novíssima cozinha dos chefs italianos.
Chefs do mundo todo - seja em Osaka, Japão, do chef Ayao Okumura, ou Peru, do chef Rafael Piqueras Bertie -, estão em movimento e a gastronomia mundial é como a água que entra em ebulição em milhões de fogões nos quatro cantos do planeta: todo dia, há uma novidade a ser experimentada, testada e lançada.
A cozinha contemporânea é como a atualidade, como a internet: milhões de informações a serem absorvidas, relidas e reinventadas. A tendência é que a gastronomia acompanhe a evolução do mundo, assim como ocorre em outros setores. Também a gastronomia é globalizada e reage à regionalização: você pode comprar em São Paulo um ingrediente que chegou ontem da Índia. A logística é muito dinâmica e, em 24 horas, qualquer produto voa de um lado para o outro.
Tudo o que temos na gastronomia atual vem do passado: Brillat-Savarin, Carême, Escoffier, Paul Bocuse. Alex Atala é um produto dessa evolução. A existência de mais de uma dezena de faculdades de gastronomia apenas em São Paulo também acontece por causa do passado.
Se não fossem os "velhos" criadores, não haveria espaço para o novo. É assim, uma geração extrapola a outra e, de repente, a vanguarda é absorvida, transforma-se em mainstream e deixa de ser referência.
É exatamente isso que estudamos - e praticamos - na disciplina Cozinha Contemporânea: temos que fundir comidas (fusion food), temos que criar, reler e desconstruir. Foi isso que começamos a fazer nesta sexta-feira, 14, na primeira aula prática de Cozinha Contemporânea. Fizemos quatro produções de fusion food: Tabule de Quinua, Ravioli de Carne de Caju, Risoto de Jerimum com Queijo de Coalho e Vermicelli de Arroz com Camarão ao Leite de Coco e Redução de Dendê (as fotos estão espalhadas pelo post).
A moda atual é aproveitar os ingredientes da terra (terroir). E isso vale para o Brasil, para a Itália, Espanha, França e Peru. Cada país tem que privilegiar os seus próprios ingredientes na moderna cozinha contemporânea. Esse é o conceito.
A receita que descrevo a seguir é a do Tabule de Quinua, que funde as cozinhas árabe e brasileira. O prato é da chef Tatiana Szeles, do restaurante Gengibre Marina, de Salvador, na Bahia. É uma delícia de prato. Só tome cuidado com a pimenta dedo de moça. Ela, como algumas mulheres, pode ser altamente histérica.
Ingredientes
- 125 gr de quinua (cereal, em grãos ou farelo; para a receita, use grãos)
- 100 gr de tomate cereja
- 1/4 de cebola roxa
- 60 gr de manga
- coentro, a gosto
- hortelã, a gosto
- 50 ml de azeite de oliva
- 10 gr de ovas de salmão
- 1 colher de café de gengibre ralado
- 1/4 de suco e de raspas de limão Siciliano
- pimenta dedo de moça a gosto
- sal a gosto
Modo de preparo
1. Deixe a quinua de molho por cerca de uma hora.
2. Cozinhe a quinua em água e sal por 15 minutos. Escorra e reserve.
3. Misture a quinua já fria com a manga cortada em cubos, a cebola picada em brunoise, o tomate cereja cortado em quatro partes (retire as sementes), o gengibre ralado, o suco e as raspas de limão, pimenta, azeite e sal.
4. Sirva com as ovas de salmão e um fio de azeite.
Na cozinha contemporânea, você pode tudo. Mas, mesmo esse "tudo" depende, basicamente, de bom senso. Você não deve misturar farinha de trigo com quinua, por exemplo. Na gastronomia atual, de restaurantes contemporâneos, há que se ter um equilíbrio de proteínas e carboidratos. Um cliente desse tipo de restaurante conhece diversas cozinhas. Portanto, os cortes devem ser perfeitos e a comida deve ter uma apresentação impecável. Moderna, sim, porém, regida pela cozinha clássica. Há que se dominar o clássico para ser moderno, eis a receita.
(Rastreie: para saber mais sobre o princípio da nouvelle couisine, que deu origem à atual experimentação na gastronomia, leia "A Cozinha de Paul Bocuse", com receitas de hors-d´oeuvre; patês, terrinas, empadões e pastelões; ovos; sopas, cozidos e consomés; molhos, peixes, mariscos, moluscos e crustáceos; escargots e rãs; carnes de açougue; aves, caça; legumes e sobremesas, todas feitas a partir de ingredientes tradicionais. Editora Record, 624 páginas, de R$ 63,00 a R$ 71,00. Pesquise e divirta-se!)
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