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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

São Pedro do Turvo no mapa

Da minha cidade natal, São Pedro do Turvo (390 Km de São Paulo, entre Bauru e Marília), sempre se questionou sua existência a cada vez que se lhe citava: "está no mapa?", "tem TV?". Essas piadinhas típicas das gentes das grandes cidades ocultam, na minha opinião, um desconhecimento de um Brasil interior que, não sei se por conta da velocidade dos tempos entre grandes e pequenas cidades ser bastante diferente, cria um abismo entre o interior e as capitais.





A despeito do fato de São Pedro do Turvo ter 120 anos de fundação (uma quase tataravó, portanto), com IDH de 0,756 (considerado médio) e uma população de 7,439 pessoas (IBGE deste ano), a expansão comercial e industrial nunca foi um fator relevante para o município. Acho que São Pedro do Turvo, 81º. município em extensão territorial do Estado de São Paulo (entre 645 municípios), sempre teve uma vocação agropecuária, até mesmo por conta do espaço dedicado ao plantio e à criação de rebanhos animais.


Ontem, terça-feira, 1º. de dezembro, constatei, com grande surpresa, que o aparente verde que toma conta da paisagem de São Pedro do Turvo é uma ilusão. Claro que nesses longos anos da minha migração de São Pedro para São Paulo, muito verde se foi: árvores, capões de mato, mata nativa e de nascente deram lugar a pastagens e, sobretudo, para o plantio de cana-de-açúcar, mandioca e soja. Mas eu não tinha dimensão de quanto estrago havia sido feito em detrimento da preservação: entre os 20 municípios com a pior pontuação ambiental, São Pedro do Turvo está em 5º. lugar no ranking negativo (num universo de 570 municípios).


A classificação negativa foi publicada pela Secretaria do Estado de São Paulo do Meio Ambiente que entregou o prêmio ambiental exatamente ontem, terça-feira, para o município de Santa Fé do Sul, que recebeu 94,40 pontos. Pelo segundo ano consecutivo, Santa Fé do Sul recebeu a classificação de "município mais verde (preservação ambiental) e azul (águas não-poluídas)". São Pedro do Turvo, com a desagradável colocação entre os piores do Estado, ficou com 11,12 pontos (veja a lista dos 20 piores abaixo).





Isso coloca o município no mapa, finalmente, a que tanto (os moradores) almejamos. Mas nos coloca em projeção negativa. Com o Google Earth, é possível, no entanto, entender o que acontece. Basta um voo satelital por toda a extensão municipal para entender porque a pontuação nos garantiu tão baixa classificação: há imensos vazios, sinais de queimadas (todo ano, a cidade convive com a execrável fumaça da queima das plantações de cana-de-açúcar) e o Rio Turvo, que nomeia a cidade, que era turvo por natureza, agora é turvo por poluição.


O fato de eu não estar no dia-a-dia na comunidade são pedrense não impede que eu chame a atenção para isso. Eu não vivo em São Pedro, mas a maior parte da minha família sim. E são essas pessoas e todos os demais habitantes da região que, de forma direta ou indireta, sofrem as consequências: calor, fenômenos ambientais cada vez mais presentes (trombas d'água, ventos fortes), moscas etc.


Quando eu morava em São Pedro, eu já não gostava da degradação que via: derrubada de matas para transformar fazendas inteiras em roças ou pastagens. Nunca fui (e nem sou tampouco agora) um 'verde', um ecologista. Mas entendo perfeitamente que a contínua degradação do ambiente nos levará (a São Pedro do Turvo, ao Brasil e ao mundo) a um estado crítico, catastrófico mesmo, de falta de água e outros males os quais nem somos capazes de prever.





O "Prêmio Município Verde" foi criado em 2007 com o objetivo de ressaltar a preocupação dos municípios com os recursos hídricos. Dos 570 municípios participantes na edição deste ano, apenas 156 receberam o certificado "verde e azul". Para se chegar à pontuação, a nota abrange dez diretrizes ambientais: esgoto tratado, lixo mínimo, recuperação de mata ciliar (vegetação nativa das margens de rios e mananciais), arborização urbana, educação ambiental, habitação sustentável, uso da água, poluição do ar, estrutura ambiental e conselho ambiental.


A conquista do prêmio vai além da vaidade: significa, para os ganhadores, prioridade na captação de recursos do governo estadual para projetos de melhoria ambiental. Em 2010, serão destinados R$ 50 milhões para esse segmento. Claro, apenas para as cidades que receberam o certificado. Mas o que está em jogo não é o dinheiro, e sim a herança que se deixará para os habitantes de São Pedro do Turvo e dos demais 5.563 municípios de todo o Brasil. Abaixo, a lista dos 20 municípios com a pior pontuação do Estado de São Paulo:


1º. Itararé - 3,22 pontos
2º. Aparecida - 6,62 pontos
3º. Cananéia - 10,17 pontos
4º. Santa Branca - 10,87 pontos
5º. São Pedro do Turvo - 11,12 pontos
6º. Itaí - 12,13 pontos
7º. Catiguá - 12,83 pontos
8º. Potim - 13,52 pontos
9º. Guareí - 13,52 pontos
10º. Pirajuí - 13,98 pontos
11º. Duartina - 14,63 pontos
12º. Cafelândia - 14,70 pontos
13º. Analândia - 15,03 pontos
14º. Itobi - 15,62 pontos
15º. Mairinque - 17,96 pontos
16º. Ferraz de Vasconcelos - 18,37 pontos
17º. Cardoso - 18,62 pontos
18º. Arapeí - 18,74 pontos
19º. Holambra - 19,45 pontos
20º. Orindiúva - 19,59 pontos

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Nude do dia

Nada de constrangimento. Ao contrário. O nome do projeto é "un.geniert", mais ou menos algo como "desavergonhado" ou, numa tradução mais livre, "sem o embaraço das roupas". E foi assim, sem roupa alguma, que 15 estudantes da Universidade de Magdeburg, da cidade de Magdeburg (capital do estado da Saxônia-Anhalt), posaram nus para o calendário de 2010. A ideia foi mostrar a rotina dos universitários de forma completamente inusitada.






Claro que isso me remete, imediatamente, ao obscuro caso dos equivalentes universitários da Unibann (é Uniban, mas chamo de "Unibann' para me referir ao verbo 'bann', banir em inglês) que, ao contrário dos colegas alemães, jamais permitiriam e até mesmo ateariam fogo nos pelados. Pergunte a Gleisy!






Bem, os estudantes alemães, muito melhor humorados do que os brasileiros, não ficaram com falsos pudores ou mentalidades arcaicas e se dispuseram a fazer as poses para o projeto. O calendário já está à venda e a renda obtida, ao contrário do que pregam os demais calendários nudistas correlatos, será investida na produção de um novo calendário, e não destinada a projetos de caridade e assistenciais. Para quem se interessar, o mimo está à venda no site do projeto por 13 euros.





A Universidade de Magdeburg é relativamente nova: foi fundada em 1993 e tem 12 mil estudantes, do mundo todo. Mas a cidade, que fica às margens do rio Elba, no centro da Alemanha, é antiga: tem quase 1,2 mil anos e fica a apenas 1:30 hora de Berlim. Com 230 mil habitantes, Magdeburg, na época da Reforma Luterana, foi centro do movimento protestante. Depois da reunificação alemã, em 1989, assim como em várias partes do país, Magdeburg está cheia de obras ao mesmo tempo em que restaura os edifícios antigos. Isso é universalidade, e não esse provincianismo tacanho alimentado por dirigentes e alunos nas universidades brasileiras.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Nude do dia

Fizeram o que tinha que ser feito: cerca de dez alunos da Universidade de Brasília (UnB) ficaram completamente nus no campus em protesto contra o episódio dos colegas que talvez usem burcas e tapa-olhos e que humilharam publicamente a colega da Unibann. Outros 150 alunos da UnB se juntaram ao protesto seminus. Os alunos da UnB tiveram o discernimento que os da Unibann não têm. A nudez, de vez em quando, tem de ser escancarada para que outros vejam quais são os reis, exatamente, que estão nus. 



segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O saber que permanece apenas na ponta do iceberg

"É apenas a ponta do iceberg", dizemos, quando queremos indicar que, se formos a fundo, existe muito mais do que aquilo que é aparente. Do iceberg, apenas 10% da massa total (ou volume) emergem. É a chamada 'ponta do iceberg'. Os 90% restantes dos blocos de gelo permanecem submersos. Em outra proporção, significa dizer que 1/7 do iceberg aflora e os demais 6/7 ficam ocultos sob a água.



Popularmente, usa-se a expressão 'ponta do iceberg' para fazer referência a algo que aparentemente é simples mas que, de fato, se for investigado ou confrontado com profundidade, a complexidade do assunto, obstáculo ou problema tende a ser muito mais árdua do que, a princípio, pensaríamos que fosse.





(Apenas 10% de um iceberg permanecem expostos na superfície; os 90% restantes estão imersos em mares profundos, penetráveis apenas por aqueles que têm persistência)


Faço uso desse mote para me referir a um artigo do escritor italiano Umberto Eco (crítico literário, professor de semiótica e autor de livros com "O Nome da Rosa" e "O Pêndulo de Foucault"), publicado no jornal "The New York Times".


O artigo de Eco aponta para a superficialidade do conhecimento que vaga, feito um iceberg, nas caudalosas águas da internet. O escritor aponta para uma dessas pontas de iceberg bastante visível: a enciclopédia online Wikipedia ( e observe que a versão disponível para o Brasil é a mesma de Portugal; não existe uma versão da Wikipedia brasileira) me fio na informação única e exclusiva da Wikipedia. Até mesmo porque não faz três ou quatro anos, as minhas fontes de consulta eram outras. Em adição à Wikipedia citada por Eco, acrescento o buscador mais famoso da internet, o Google.





(O globo enciclopédico cujo objetivo é aglutinar o saber humano num só local)


Recorremos ao Google para saber tudo: informações, endereço de determinado restaurante, site da companhia aérea, clima no norte ou no sul, cotação da moeda, preço do iPhone, condições das rodovias, situação no Irã. Não há assunto ou tema que não esteja contido no Google. Mas até que ponto essa dependência pode nos levar a um empobrecimento? Quais são as ferramentas que nos permitem entender a ponta do iceberg e mergulhar até profundas águas para lhe conhecer a base?


Se Eco reprime o uso da Wikipedia, o mesmo valor que o escritor atribui à enciclopédia eu atribuo ao buscador. Claro que ambos facilitam o acesso à informação. Mas trata-se de ter, principalmente, massa crítica (e sonares e radares eficientes) para pescar da rede/web/teia sob a superfície. Ou então estaremos em um processo irrevogável de formação de conhecimento de ponta. De ponta do iceberg, e não de ponta em termos de avanço tecnológico ou científico.





(Esse é o volume em papel que teria a Wikipedia se impressa fosse)


Reproduzo a seguir o artigo de Eco que serve como parâmetro para questionar o quão importante ferramentas como Wikipedia e Google podem ser. Na minha opinião, isso depende de cada um de nós. O meu saber particular eu o absorvo de inúmeras fontes - jornais impressos, revistas, livros, sites noticiosos etc. Para o meu trabalho, o Google é uma excelente ferramenta de localização de dados, fontes e links que me fornecem elementos para eu escrever artigos. E, eventualmente, uso dados da Wikipedia até mesmo para escrever posts neste blog. Mas, lhe asseguro, não me submeto inteiramente a essas ferramentas jamais.


Pode me chamar de antigo, mas prefiro recorrer ao velho dicionário impresso e, sim, aos volumes clássicos da minha própria enciclopédia Larrouse. O papel me dá uma segurança que nunca a tive no cristal líquido da tela do meu computador. E os dados, como se sabe, podem omitir, mentir ou deixar de existir de repente. Ao menos o papel tem uma vida útil equivalente à minha própria e por ora isso me basta. Ao artigo:





(O escritor Umberto Eco, cujos dados na Wikipedia sempre estão incorretos, ainda que ele mesmo os atualize)


"Hoje em dia, as pessoas que precisam checar um nome ou uma data tendem a recorrer à Wikipedia. Para a minoria que ainda não sabe do que se trata, a Wikipedia é uma enciclopédia online constantemente escrita e reescrita por seus usuários. Em outras palavras, se você buscar um verbete como "Napoleão" e perceber que há alguma informação incompleta ou incorreta, você pode se registrar no site, editar o texto e salvar a versão correta na base de dados.


Naturalmente, isso permite que algumas pessoas irresponsáveis e mal intencionadas disseminem informações falsas, mas os milhões de usuários também podem atuar e checar uns aos outros. Se alguém alterou o texto sobre Napoleão Bonaparte, e mudou o lugar de sua morte para Santo Domingo em vez de Santa Helena, outros iriam imediatamente corrigi-lo (e eu acredito que depois que várias pessoas entraram com processos de calúnia contra a Wikipedia, um tipo de conselho editorial foi estabelecido para exercer controle sobre as mudanças que são difamatórias). Nesse sentido, a Wikipedia confirma as teorias do filósofo norte-americano Charles Sanders Peirce, de uma comunidade (científica) que através de um tipo de homeostase elimina os erros e legitima novas descobertas, e continua, assim, a carregar o que ele chamou de tocha da verdade.


Mas, embora esse controle coletivo mantenha a acuidade do texto sobre Napoleão, será que fará o mesmo para um João da Silva? Para dar um exemplo, vamos observar o texto sobre uma pessoa que é um pouco mais conhecida do que João da Silva, porém menos famosa do que Napoleão - em outras palavras, eu mesmo. Há algum tempo eu corrigi o texto sobre "Umberto Eco" porque ele continha informações falsas. Entre outras invenções, estava escrito que eu sou o mais velho de treze filhos. Isso é verdade no caso do meu pai, não no meu. Todas as vezes que a curiosidade me levou a checar o texto sobre mim, encontrei mais nonsense, então desisti.


Recentemente, alguns amigos informaram-me que o texto da Wikipedia dizia que eu havia me casado com a filha do meu ex-chefe, o editor italiano Valentino Bompiani. Isso não é nem um pouco difamatório, mas no caso de suas filhas - minhas queridas amigas Ginevra e Emanuela - pensarem assim, eu eliminei a informação. Nesse caso não é possível argumentar que isso foi um erro compreensível - como a história dos trezes filhos - ou que simplesmente perpetuou um rumor corrente: ninguém nunca nem mesmo pensou que eu poderia me casar com qualquer uma delas. O editor anônimo da Wikipedia havia modificado o texto para disseminar sua fantasia particular, sem checar a informação com nenhuma fonte.


Então, o quão confiável é a informação encontrada na Wikipedia? Quando eu a uso, emprego as ténicas utlizadas pelos acadêmicos profissionais: leio sobre um determinado tópico na Wikipedia e depois comparo com a informação com material encontrado em três ou quatro outros sites. Se o fato for confirmado por três fontes diferentes, então há uma boa possibilidade de que seja verdade - mas fique atento para os sites que são parasitas da Wikipedia, porque eles simplesmente repetem os erros.


Outro método é ler sobre o mesmo tópico na Wikipedia, mas em outra língua - se o seu Urdu estiver meio enferrujado, você pode experimentar as versões italiana ou francesa. Se elas forem diferentes, você poderá encontrar a contradição. Isso, por sua vez, fará com que você se levante da escrivaninha e consulte uma enciclopédia impressa, apesar de sua fé convicta no virtual.


Esses são métodos de um acadêmico que aprendeu como descobrir os fatos ao comparar as fontes. E os outros? Os crentes? As crianças que usam a Wikipedia para suas tarefas escolares? Tenham em mente que o que eu escrevi aqui sobre a Wikipedia é verdadeiro para qualquer outro site. Tanto assim que já faz um certo tempo que defendo o estabelecimento de um centro de monitoramento da internet no qual um comitê de especialistas conceituados revisaria e avaliaria os sites por sua confiabilidade e precisão.


Mas vamos considerar outro exemplo, um que não envolva um nome histórico como Napoleão (com dois milhões de entradas no Google), mas o de um jovem escritor que trabalhou na obscuridade até um ano atrás, quando ganhou o Prêmio Strega, de grande prestígio literário na Itália. Falo de Paolo Giordano, autor de "The Solitude of Prime Numbers" ("A Solidão dos Números Primos"). Uma busca por seu nome no Google resulta em 242 mil entradas. Como podemos monitorar todos esses sites?


Pensei em monitorar apenas sites dedicados um único autor sobre quem estudantes possam buscar informações com frequência. Mas se alguém fizer uma busca pelo nome de Peirce (o filósofo que mencionei no início), a busca resulta em quase um milhão de entradas.


Então, temos um sério problema que, por enquanto, não tem solução."

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Ato número 1, parágrafo 2º., artigo ix

Acabei de ler uma informação sobre etiqueta na internet, de forma geral. O autor lista algumas coisas que podem e outras que não devem ser feitas por meio de serviços como o Twitter ou até mesmo pelo telefone móvel.

As regras de etiqueta são antigas. É um conjunto de regras (convenções) que, teoricamente, deve nortear as relações entre as pessoas. Um leitor, anônimo (e sempre o são, nesses casos), me critica por um post já antigo no qual eu falava sobre a nudez e lança mão justamente dessa palavra, convenção, para que eu me coloque no devido lugar que me cabe na sociedade, se é que eu caibo nela.


Por princípio, acredito que convenções e regras existem para, em alguns casos, serem quebradas. As convenções, então, me soam ainda pior, já que alguém, um dia, criou um conjunto de regras e as nomeou como "convenções". Portanto, convencionou-se que, a partir de determinado momento no tempo, as coisas eram assim e não assado.

Claro que existem parâmetros a serem seguidos porque, se não o fossem, seríamos, os humanos, equivalentes a um bando de bichos desregrados, soltos, primitivos. Mas atachar em mim alguns rótulos de convenções não me apetece, de forma alguma. Tudo pode ser uma convenção: desde uma reunião de condomínio na qual se convenciona que os moradores não podem jogar lixo dentro do elevador até a convenção formal de que temos que nos postar respeitosamente quando a rainha da Inglaterra passa com a caravana.


E, dentro dessas categorias de trejeitos, comportamentos, atitudes e gestos, há duas macro-regras de etiquetas: uma, a etiqueta à mesa; a outra, a etiqueta de internet (ou de aparatos ou gadgets como celulares e MP3), que é a netiqueta. E, como as noções de cada ser variam muito, é praticamente impossível que se façam etiquetas padrões. Geralmente, há um comportamento médio aceito por todos, baseados em cortesia e educação. É um código não-escrito (embora os haja, escritos, aos montes, em livros e dicas de como se comportar nas mais inusitadas situações).

Há outros campos abrangidos pela etiqueta: a moda, a forma como se segura um copo, como se sentar diante das pessoas, quem servir primeiro, a quem se dirigir para questionar algo. São centenas de pequenas regras que, se vistas no conjunto, me parecem escadarias de teatros antigos, com milhares de degraus a serem superados até que se atinja o topo.


Mas as etiquetas estão atreladas a fatores culturais, inclusos os de tradições de cada povo e, assim, o que é um código no Brasil, não o é na Finlândia, por exemplo. Andar de mãos dadas, em alguns países, é um atentado ao pudor. Em outros, o estranho é quando dois homens não andam de mãos dadas. E, de volta à crítica do leitor anônimo, andar pelado em alguns lugares é ofensivo e em outros, como recentemente na Inglaterra, o ideal é que se trabalhe nu às sextas-ferias. São códigos, convenções.

E, assim como você e eu, na média, estamos amparados por convenções, quando as quebramos, ou sugerimos alguma quebra, somos logo repreendidos por querer escapar desse cerco moral. Esses códigos me remetem a outros, aqueles códigos éticos de máfias italianas, de detentos em presidiários e ainda outros relacionados ao mundo do crime segundo os quais você pode ser condenado à morte se ousar quebrá-los. É algo bastante leviano, do meu ponto de vista, porque, por princípio, você pode matar seu rival, mas não pode, em alguns casos, mostrar os pés descalços (caso de algumas prisões, quando na presença de familiares de outros presos).


Então, o que é convenção? Que etiqueta adotar? E há que se adotá-la? Por que, assim que aparece algo novo (como a internet), uma das primeiras providências que se toma é formalizar um conjunto de regras para se movimentar nesse ambiente? No Twitter, novíssimo fenômeno, não raro eu me deparo com uma série de comentários que me dizem e aos demais como nos comportarmos: isso pode, isso não pode!

O que sei, e pratico, é que há um princípio de bom senso que norteia tudo. O legal é quando conseguimos distinguir a expressão (que, a priori, deve ser livre, ao menos aqui no texto do blog) do fato. A isso se 'convenciona' chamar de respeitar as diferenças.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Te vejo no ano 3.000

As temperaturas elevadas em todo o planeta continuarão altas até o ano 3.000, com consequências graves para a Região Nordeste do Brasil, sul da África, alguns lugares da Bacia do Mediterrâneo e na Austrália. A conclusão é de estudo publicado por cientistas do Painel do Clima das Nações Unidas (IPCC) na revista "PNAS".


E nem adianta se lamentar a essa altura: mesmo que todas as emissões de gás-estufa fossem zeradas hoje, o aquecimento global continuará sua marcha inconteste. Um aquecimento médio de 2 ºC da superfície terrestre significará a redução das chuvas durante o inverno das regiões acima citadas.

Na década de 30, os EUA foram, em parte, arrasados pelo "dust bowl" - grande seca que arrasou a agricultura norte-americana e agravou a Grande Depressão. Durante 20 anos, o dust bowl reduziu as médias de chuva em 10% naquela região.


(Um 'dust bowl' em ação nos EUA)

De forma que, a se confirmarem as previsões dos cientistas, a mudança climática - sentida por todos nós tanto no inverno quanto no verão - é irreversível, no mínimo, pelos próximos mil anos. Isso decorre do fato de que, a despeito das consequências do gás carbônico (causador do efeito estufa) persistir no ar durante 100 anos, o oceano, independentemente disso, reemitirá calor por séculos e séculos, amém.

Antes desse aterrador estudo, imaginava-se que, ao se cessarem as emissões de dióxido de carbono (CO2), o clima voltaria ao normal em 100 ou 200 anos. Além de fazer essas previsões catastróficas, o estudo estimou, ainda, o que ocorrerá com o nível do mar até o final deste século: para uma concentração de CO2 na atmosfera de 600 partes por milhão (atualmente, essa proporção é de 385 partes por milhão), os oceanos subiriam de 40 cm a 1 metro até 2100. E, mesmo sem que se acrescente uma mínima grama de CO2 na atmosfera, o nível do mar continuará a se elevar. E, pior: o estudo prevê apenas a expansão térmica, e não inclui o degelo polar, cujas consequências ainda não são conhecidas.

Por enquanto, a sugestão dos cientistas é apenas uma: cortar ainda mais as emissões de CO2. De resto, todos sabemos a duras penas o que ocorre. E não é pouco: a partir das tsunamis da Ásia, qualquer fenômeno natural é possível. Veja as recentes ocorrências pluviométricas de Santa Catarina, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Testemunhos dos tufões que agitaram o litoral do Estado de São Paulo (Guarujá e Caraguatatuba) dão conta de que nada parecido havia sido visto nesses locais.

E, não sei se você concorda comigo, mas em São Paulo (capital e interior), há um vento constante que parece não acabar nunca. Vento que, antes, limitava-se, sobretudo, ao mês de agosto. E o verão? O verão começou em dezembro aqui no Brasil e há dias que se equivalem aos meses de junho e julho.

O universo conspira a favor de quem, cara pálida? E não adianta se safar com uma saída à francesa do tipo "Não viverei até 3.000". Não, provavelmente, menos de meia dúzia de nós mal conseguirá chegar ao ano de 2100. Contudo, parece que a Terra não tem mais tempo para esperar. E nós todos, muito menos!

quarta-feira, 25 de junho de 2008

O poder do fracasso

Minha querida amiga Alessandra, que vive e trabalha em NY, é uma pessoa que some, desaparece, não emite sinais virtuais ou reais. Parece que atravessa a Central Station para um outro universo de vez em quando. Se, periodicamente, ela não visitasse o Brasil, eu diria que essa bruxinha está na escola de Hogwarts, como professora de magia. De vez em quando, no entanto, dá o ar de sua graça. Desta vez, em e-mail coletivo (marca registrada da criatura), nos enviou o discurso de abertura da cerimônia dos graduandos de Harvard.

Segundo a Ale, muitos alunos torceram o nariz quando descobriram que quem faria o discurso de abertura seria a autora J.K. Rowling (Joanne Kathleen Rowling), da saga de Harry Potter, o bruxinho mais famoso de todos os tempos.

O discurso, que reproduzo abaixo, é longo. Mas, se você tiver tempo, leia. Rowling fala do fracasso e do seu aprendizado na Anistia Internacional, onde trabalhou. Ale, não é que temos entre nós nossos próprios Comensais, não da morte, como diz a autora, mas, da vida?!


"Presidente Faust, membros da Corporação Harvard e da Câmara de Administradores, membros do corpo docente, pais orgulhosos e, acima de tudo, diplomados. A primeira coisa que eu gostaria de dizer é muito obrigado. Não apenas Harvard me deu uma honra extraordinária, mas, as semanas de medo e náusea que eu tenho experimentado em pensar de fazer esse discurso na cerimônia de formatura me fez perder peso. Uma situação com ganho das duas partes! Agora, tudo o que eu tenho a fazer é respirar fundo, dar uma olhada nas bandeiras vermelhas e enganar a mim mesma acreditando que estou na mais educada convenção Potter do mundo. Fazer um discurso de formatura é uma grande responsabilidade; ou assim eu pensava até voltar a minha mente para a minha própria formatura. O orador da cerimônia daquele dia foi a distinta filósofa britânica Baronesa Mary Warnock. Refletir em seu discurso me ajudou enormemente a escrever esse aqui, porque percebi que eu não conseguia lembrar de uma única palavra que ela disse. Essa descoberta libertadora me levou a prosseguir sem qualquer receio de que eu poderia influenciar vocês inadvertidamente a abandonar suas carreiras promissoras no negócio, justiça ou política para as delícias vertiginosas de se tornar um bruxo gay.

Estão vendo? Se tudo o que vocês se lembrarem nos próximos anos for a piada do “bruxo gay”, eu ainda saí à frente da Baronesa Warnock. Objetivos alcançáveis: o primeiro passo para o sucesso pessoal.

Na verdade, eu tenho movido minha mente e meu coração para o que eu deveria dizer hoje a vocês. Perguntei a mim mesma o que desejaria ter ficado sabendo em minha própria formatura, e quais lições importantes eu aprendi nos 21 anos que se passaram entre aquele dia e esse.

Surgiram-me duas respostas. Nesse dia maravilhoso, quando estamos todos reunidos para celebrar seu sucesso acadêmico, eu tomei a decisão de falar com vocês sobre os benefícios de um fracasso. E, como vocês estão no limite do que muitas vezes é chamado de ‘vida real’, eu quero exaltar a importância crucial da imaginação.

Essas podem parecer escolhas quixotescas ou paradoxais, mas, por favor, me ouçam.

Olhar para trás, aos meus 21 anos de idade que eu tinha na formatura, é uma experiência um pouco desconfortável para a de 42 anos na qual ela se tornou. Metade do tempo de minha vida, eu estava notavelmente com um equilíbrio preocupante entre a ambição que eu tinha para mim mesma, e o que aqueles mais próximos esperavam de mim.

Estava convencida de que a única coisa que eu queria fazer, sempre, era escrever romances. No entanto, meus pais, ambos os quais vieram de origens pobres e nenhum dos quais tinham ido à faculdade, tiveram a idéia de que a minha imaginação hiperativa era um loucura pessoal de divertimento e que nunca poderia pagar uma hipoteca, ou garantir uma pensão.

Eles tinham esperanças de que eu teria um grau vocacional; eu queria estudar Literatura Inglesa. Um compromisso que foi alcançado e que, em retrospectiva, não satisfez ninguém, e eu fui estudar Idiomas Modernos. Mal o carro dos meus pais dobrava a esquina no fim da rua e eu descartava Alemão e corria abaixo para os corredores de Clássicos.

Não me lembro de dizer aos meus pais que estava estudando Clássicos; eles podem muito bem ter descoberto pela primeira vez no dia da graduação. De todos os assuntos desse planeta, acho que eles dificilmente poderiam apontar um nome menos útil do que Mitologia Grega, quando isso veio para assegurar as chaves para um banheiro executivo.

Eu gostaria de deixar claro, entre parênteses, que não culpo meus pais pelo seu ponto de vista. Existe uma data de validade em culpar seus pais por colocá-lo na direção errada; o momento que você é velho suficiente para tomar a direção, a responsabilidade recai sobre você. Além disso, eu não posso criticar meus pais por esperarem que eu nunca experimentasse a pobreza. Eles tinham sido pobres, e eu já fui pobre, e concordo completamente com eles de que esta não é uma experiência que enobrece. A pobreza implica em medo, e estresse, e, algumas vezes, depressão; isso significa milhares de pequenas humilhações e dificuldades. Escalar para sair da pobreza por seus próprios esforços é de fato algo para se orgulhar, mas, a pobreza em si é romantizada apenas por tolos.

O que eu mais temia para mim na idade de vocês não era a pobreza, mas, o fracasso.

Na sua idade, apesar de uma clara falta de motivação na universidade, onde eu tinha gastado muito tempo escrevendo histórias em bares de café, e pouquíssimo tempo em palestras, eu tinha uma habilidade especial para passar em exames e que, por anos, tinha sido a medida de sucesso na minha vida e nas de meus colegas.

Não sou tola o suficiente para supor que, por serem jovens, talentosos e bem educados, vocês nunca tiveram dificuldades ou mágoas. O talento e a inteligência nunca vacinou ninguém contra o capricho do destino, e por nem um momento eu supus que todos aqui têm se beneficiado de uma existência de privilégios serenos e contentamento.

No entanto, o fato de vocês estarem se graduando em Harvard sugere que não estão muito bem familiarizados com o fracasso. Vocês poderão ser conduzidos por um receio de fracasso tão grande quanto um desejo pelo sucesso. De fato, sua concepção de fracasso pode não estar muito longe da idéia de sucesso de uma pessoa comum, tão alto que vocês já voaram academicamente.

No fim das contas, todos nós temos de decidir por nós mesmos aquilo que constitui o fracasso, mas, o mundo é bastante ávido para lhe dar um conjunto de critérios, se você deixá-lo. Por isso acho justo dizer que por qualquer medida convencional, meros sete anos após o dia da minha formatura, eu tinha fracassado em escala épica. Um casamento de excepcionalmente curta duração, e eu estava sem emprego, mãe solteira, e tão pobre quanto é possível ser na Grã-Bretanha moderna sem ser uma desalojada. Os receios que meus pais tinham tido para mim, e que eu tinha tido para mim, ambos tinham vindo para passar, e por cada padrão normal, eu era a maior fracassada que eu conhecia.

Agora, eu não vim para ficar aqui e lhes dizer que o insucesso é divertido. Esse período da minha vida foi bem obscuro, e eu não tinha idéia de que ia acontecer aquilo que a imprensa tem, desde então, descrito como uma espécie de fim de conto de fadas. Eu não tinha idéia do comprimento do túnel, e por muito tempo, qualquer luz em seu fim era mais uma esperança do que realidade.

Então, por que eu falo sobre os benefícios do fracasso? Simplesmente porque fracasso significa se despir do não-essencial. Eu parei de fingir a mim mesma que eu era qualquer outra que não eu, e comecei a orientar toda a minha energia em terminar o único trabalho que importava para mim. Se eu realmente tivesse alcançado sucesso em qualquer outra coisa, poderia nunca ter encontrado determinação para ter sucesso naquela área na qual eu verdadeiramente acreditava que pertencia. Eu estava em liberdade, porque o meu maior receio já tinha sido realizado, e ainda estava viva, e ainda tinha uma filha a quem adorava, e tinha uma velha máquina de escrever e uma grande idéia. O fundo de pedra do poço se tornou a base sólida sobre a qual reconstruí a minha vida.

Talvez vocês nunca falhem na escala que falhei, mas, alguns fracassos na vida são inevitáveis. É impossível viver sem falhar em algo, ao menos que você viva de forma tão cautelosa que você poderia não ter vivido de forma alguma - nesse caso, você falha por omissão.

O fracasso me deu uma segurança interna que eu nunca tinha atingido passando em exames. O fracasso me ensinou coisas sobre mim que eu não poderia ter aprendido de nenhuma outra forma. Descobri que tinha uma forte vontade e mais disciplina que suspeitava; também descobri que tinha amigos cujo valor estava realmente acima de rubis.

O conhecimento que você adquire sábia e fortemente a partir de uma derrota significa que você está, sempre depois, seguro em sua capacidade de sobreviver. Vocês nunca vão conhecer verdadeiramente a si mesmos, ou a força de seus relacionamentos, até que ambos tenham sido testados em adversidade. Esse conhecimento é um verdadeiro dom para todos os que venceram penosamente, e tem valido mais para mim do que qualquer qualificação que já ganhei.

Se me fosse dada uma máquina do tempo ou um Vira-Tempo, eu diria a mim aos 21 anos que a felicidade pessoal reside em saber que a vida não é uma lista de verificação de aquisições ou realizações. As suas qualificações, seu currículo, não são sua vida, embora você vá conhecer muitas pessoas da minha idade e mais velhas que confundem as duas coisas. A vida é difícil e complicada, e além do controle total de qualquer um, e a humildade de saber isso irá te capacitar a sobreviver às suas subidas e descidas.

Vocês poderiam pensar que escolhi meu segundo tema, a importância da imaginação, devido ao seu papel na reconstrução de minha vida, mas não é inteiramente por isso. Ainda que eu defenda o valor de contar histórias para dormir até meu último suspiro, tenho aprendido a valorizar a imaginação em um sentido muito mais amplo. A imaginação não é apenas a única capacidade humana para prever aquilo que não é, e, por conseguinte, a fonte de todas as invenções e inovações. Na sua argumentável mais transformadora e capacidade reveladora, é o poder que nos permite simpatizar com seres humanos cujas experiências nós nunca compartilhamos.

Uma das maiores experiências da minha vida precedeu Harry Potter, apesar dela entregar muito do que eu escrevi nesses livros em seguida. Essa revelação veio na forma de um dos meus primeiros empregos diurnos. Embora estivesse inclinada a escrever histórias durante minha hora de almoço, paguei o aluguel, nos meus vinte e poucos anos, trabalhando no departamento de investigação na sede da Anistia Internacional, em Londres.

Lá, em meu pequeno escritório, li cartas rabiscadas rapidamente contrabandeadas dos regimes totalitários por homens e mulheres que arriscam serem presos para informar ao mundo exterior do que estava acontecendo a eles. Eu vi fotografias daqueles que tinham desaparecido sem deixar rastro, enviadas à Anistia pelas suas famílias e amigos desesperados. Eu li os testemunhos das vítimas de tortura, descrições de testemunhas oculares dos julgamentos e execuções sumárias, de seqüestros e estupros.

Muitos dos meus colegas de trabalho eram ex-presos políticos, pessoas que tinham sido deslocadas de suas casas, ou fugiram para o exílio, porque eles tiveram a temeridade de pensar independente de seu governo. Os visitantes do nosso escritório incluíam aqueles que tinham vindo para dar informações, ou tentar e descobrir o que havia acontecido àqueles que eles tinham sido forçados a deixar para trás.

Nunca vou esquecer o africano vítima de tortura, um jovem não mais velho do que eu era naquela época, que tinha se tornado mentalmente doente depois de tudo que ele tinha sofrido em sua terra natal. Ele tremia incontroladamente enquanto falava para uma câmera de vídeo sobre a brutalidade exercida contra ele. Ele era alguns centímetros mais alto que eu, e parecia tão frágil quanto uma criança. Foi-me dada a tarefa de escoltá-lo à estação de metrô mais tarde, e esse homem cuja vida foi destroçada pela crueldade pegou a minha mão com sensível cortesia e me desejou um futuro de felicidade.

E, enquanto eu viver, vou lembrar de caminhar por um corredor vazio e, de repente, ouvir por detrás de uma porta fechada, um grito de pânico e horror como nunca ouvi antes. A porta se abriu, e a pesquisadora enfiou sua cabeça e me disse para correr e fazer uma bebida quente para o jovem homem sentado com ela. Ela tinha acabado de lhe dar a notícia de que, em retaliação por sua própria sinceridade contra o regime de seu país, sua mãe havia sido presa e executada.

Todos os dias da minha semana de trabalho no início dos 20 anos eu era lembrada do quão incrivelmente sortuda era por viver em um país com um governo democraticamente eleito, onde um representante legal e um julgamento público eram os direitos de todos.

Todos os dias, via mais provas sobre como os males da humanidade vão infligir sobre os seus companheiros, para obter ou manter o poder. Comecei a ter pesadelos, literalmente pesadelos, acerca de algumas das coisas que vi, ouvi e li.

E, ainda assim, aprendi mais sobre a bondade humana na Anistia Internacional que eu nunca havia sabido antes.

A Anistia mobiliza milhares de pessoas que nunca foram torturadas ou presas por suas crenças a agir em nome daqueles que já foram. O poder da empatia humana, que conduziu à ação coletiva, salva vidas e liberta prisioneiros. As pessoas comuns, cujo bem-estar pessoal e segurança estão assegurados, juntam-se a um grande número para salvar pessoas que eles não conhecem e nunca vão conhecer. Minha pequena participação nesse processo foi uma das experiências mais inspiradoras da minha vida.

Diferente de qualquer outra criatura nesse planeta, os seres humanos podem aprender e compreender sem terem experimentado. Eles podem pensar em si mesmos na mente de outras pessoas, se imaginar no lugar de outras pessoas.

Evidentemente, esse é um poder, como a minha marca de magia fictícia, que é moralmente neutro. Podemos usar a habilidade tanto para manipular, ou controlar, como simplesmente para compreender ou simpatizar.

E muitos preferem não exercer suas imaginações de forma alguma. Eles optam por permanecer confortavelmente dentro dos limites de sua própria experiência, nunca se preocupando em perguntar como seria ter nascido diferente do que são. Eles podem se recusar a ouvir os gritos ou espreitar dentro das grades; eles podem fechar suas mentes e corações para qualquer sofrimento que não os toque pessoalmente; eles podem se recusar a saber.

Eu poderia ser tentada a invejar pessoas que conseguem viver dessa maneira, exceto por achar que eles não tem menos pesadelos que eu. Escolher viver em espaços estreitos pode levar a uma forma de agorafobia (medo de lugares abertos), e que traz isso aos seus próprios pavores. Eu acho que o intencionalmente sem imaginação vê mais monstros. Muitas vezes eles têm mais medo.

Além disso, aqueles que optam por não se simpatizar podem ser os verdadeiros monstros. Sem nunca cometer um ato claro de maldade à gente, nós colaboramos com isso através da nossa própria apatia.

Uma das muitas coisas que aprendi no fim do corredor de Clássicos no qual me aventurei aos 18 anos, em busca de algo que eu não poderia definir, foi isso, escrito pelo autor grego Plutarco: O que nós alcançamos internamente mudará a realidade exterior.

Essa é uma afirmação surpreendente e ainda comprovada milhares de vezes todos os dias da nossa vida. Ela exprime, em parte, a nossa inadiável ligação com o mundo exterior, o fato de que nós tocamos as vidas de outras pessoas simplesmente por existirmos.

Mas, o quanto vocês estão, diplomados de 2008 de Harvard, provavelmente tocando as vidas de outras pessoas? Sua inteligência, sua capacidade para o trabalho duro, a educação que vocês ganharam e receberam, dão a vocês status e responsabilidades únicos. Até a sua nacionalidade os destaca. A grande maioria de vocês pertence à única superpotência remanescente do mundo. A maneira que você vota, a maneira que vive, a maneira que protesta, a pressão pela qual você passa para sustentar seu próprio governo, tem um impacto muito além de suas fronteiras. Esse é o seu privilégio e o seu fardo.

Se você escolher usar seu status e influência para levantar sua voz em nome daqueles que não têm voz; se você optar por se identificar não apenas com os poderosos, mas com a impotência; se você manter a capacidade de imaginar a si mesmo na vida daqueles que não têm as suas vantagens, então não vão ser apenas as suas orgulhosas famílias que vão celebrar a sua existência, mas milhares e milhões de pessoas cuja realidade você tem ajudado a transformar para melhor. Nós não precisamos de magia para mudar o mundo, nós já carregamos todo o poder que precisamos dentro de nós mesmos: nós temos o poder de imaginar melhor.

Estou quase terminando. Tenho uma última expectativa para vocês, que é algo que já tinha aos 21. Os amigos com quem me sentei no dia da formatura têm sido os meus amigos para a vida. Eles são os padrinhos dos meus filhos, as pessoas a quem eu tenho sido capaz de recorrer em momentos de dificuldades, os amigos que têm a gentileza de não me processar quando usei seus nomes para os Comensais da Morte. Na nossa formatura, fomos ligados por uma enorme afeição, pelas nossas experiências compartilhadas de um tempo que nunca poderia voltar e, é claro, pelo conhecimento que temos guardado em certas evidências fotográficas que seriam extremamente valiosas se alguns de nós concorresse a Primeiro-Ministro.

Portanto, hoje posso lhes desejar nada melhor do que amizades parecidas. E amanhã, mesmo se vocês não lembrarem uma única palavra minha, espero que se lembrem aquelas de Seneca, outro desses antigos romanos que conheci quando fugi para o corredor de Clássicos, em fuga de uma carreira promissora, em busca da antiga sabedoria:

Conforme um conto, assim é a vida: não o quão longa ela é, mas o quão boa, é o que importa.

Desejo a todos vidas muito boas.

Muito obrigado."

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Sem limites

Raimunda Nonata, de 82 anos, prestou vestibular para uma vaga de serviço social numa universidade particular de Santarém, no Pará. Raimunda concluiu o ensino médio apenas dois dias antes de prestar o vestibular. Sem perder tempo, tentará agora o ensino superior. A idéia de prestar vestibular partiu da própria Raimunda, que teve o apoio de toda a família. A filha e a neta de dona Raimunda aguardaram com expectativa a vestibulanda entregar a prova. A caloura de vestibular ficou duas horas e meia na sala de aula para fazer a prova e disse que estava nervosa e com frio por todo o corpo. Conheço pessoas próximas de mim, não com tanta idade, mas, com a família inteira a ser criada, que voltaram para os bancos das escolas e hoje são o que são por esse ato heróico. Porque, estudar, no Brasil, e principalmente em cursos superiores, é um heroísmo. No ano passado, depois de mais de dez anos, voltei a prestar vestibular. Já se passou um ano e concluo agora o 1º. ano de gastronomia. No meio deste ano, prestei o ENEM (fiquei com média 72, o que acho muito bom). Na minha classe, há uma senhora que voltou a estudar depois de muitos anos. A educação formal não é apenas o caminho para se obter um papel timbrado. É uma saída. É um gesto de mudança. Parabéns para essa senhora e para tantas outras (principalmente mulheres) que não temem mais nada, a não ser o fato de não poder aprender mais e mais. Para a educação, nunca há um limite. Muito menos a idade. Uma leitora comentou que adorou o nome deste blog. Pois é, Sônia, essa senhora e muitas outras estão a caminho de construir uma vida menos ordinária. Eu acho o máximo!

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Publicidade X polêmica

As campanhas publicitárias adoram criar polêmicas e, encima disso, faturar para o cliente. Na Itália, que há poucas semanas debateu a anorexia retratada por Oliviero Toscani para a grife No.l.ita, um anúncio publicitário voltou a fazer barulho. O anúncio é parte de uma campanha contra a discriminação dos homossexuais que exibe um recém-nascido com uma pulseira de identificação com a palavra "homossexual" no lugar do nome. A foto e o assunto tomaram conta da Itália, em reações de apoio e contra, segundo a AFP e o UOL. "A orientação sexual não é uma escolha" é o lema da campanha usado nos anúncios espalhados pela região da Toscana (centro-norte) e reproduzidos nos jornais italianos. Segundo o deputado democrata-cristão Luca Volontè, "usar recém-nascidos para fazer crer que a tendência homossexual é uma característica inata é um erro e uma vergonha". A campanha é de "mau gosto", disse o filósofo Gianni Vattimo, que é gay. A principal associação de defesa dos direitos dos homossexuais na Itália, a ArciGay, saudou a iniciativa, que mostra que a homossexualidade é um "dom imutável que deve ser respeitado". Não sei se, no balanço geral, o público-alvo, que são as pessoas comuns, e não políticos, filósofos ou gays, será atingido de forma positiva. Na maioria das vezes, tratar um assunto de forma polêmica, para mim, faz com que as pessoas reajam mal e negativamente. O uso de um bebê pode suscitar em muitos o repúdio - contra o gay e contra a peça publicitária. A peça publicitária da No.l.ita, de Toscani, foi proibida, no final das contas. Quem ganhou com isso? Garanto que não foram as pessoas que sofrem de anorexia. Assim como não ganharão os gays porque uma campanha resolveu determinar que a pulseirinha que identifica o bebê deve rotular desde o início sua condição sexual. É ou não uma forma cifrada de discriminação? Ou por acaso está escrito a palavra "heterossexual" nas pulseirinhas de bebês que não são gays?

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

HOT/NOT do Brasil

Foi divulgada nesta sexta-feira, 14, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2006, do IBGE. Há boas (Hot) e más (Not) notícias. Vamos às boas:

Hot: a população chegou a 187,2 milhões, crescimento de apenas 1,42% em relação a 2005. O número de computadores residenciais cresceu para 22,4% (18,6% em 2005), o que significa maior acesso à internet. As linhas telefônicas fixas estão presentes em 74,5% das casas (71,6% em 2005), o que confirma que o brasileiro tem mais possibilidade de se conectar à internet. Os telefones móveis chegam a 27,7% das residências (23,5% em 2005). O número de pessoas com carteira assinada está em 30,1 milhões, ante 28,8 milhões de 2005. A participação da mulher no mercado de trabalho atingiu 31,4% (30,6% em 2005). E, hot hot, nos últimos dez anos, o percentual de crianças de 7 a 14 anos fora da escola caiu de 8,7% para 2,3%, ou seja, 97,7% das crianças nessa faixa etária estão matriculadas. Os velhos dilemas de sempre aparecem para lembrar que o decantado "espetáculo do crescimento" não passa de fogo de palha. Se o consumo de bens aumentou, o "consumo social" está coberto por teia de aranha, "imexível" nas palavras daquele outro:


Not: o prazer vem e vai num flash: também nos últimos 10 anos, o rendimento médio mensal do brasileiro caiu 9,4%, para R$ 883 (R$ 975 em 1996). A média nacional de alfabetização é de 90,4%, mas quase 20% dos nordestinos não saber ler ou escrever. Se a educação é um fator preponderante para a conquista no mercado de trabalho, há uma inversão aqui: a taxa de desocupação entre as pessoas com 11 anos de escolaridade ou mais foi de 8,3%, ante 4,1% com pessoas com menos de um ano de instrução formal. A rede de esgoto, requisito básico de melhoria de qualidade de vida, inexiste em 29,4% dos domicílios brasileiros. E a coleta do lixo é apenas um sonho para mais de 7 milhões de pessoas. O índice de Gini (padrão internacional para medir a desigualdade dos países) caiu de 0,543 em 2005 para 0,540 em 2006. É uma redução minúscula da distribuição de renda, fator apontado como um dos principais entraves à evolução de qualquer país. Se as mulheres estão em alta, bem-feito para nós: o ano passado foi pior para os homens do que há dez anos. Em 2006, 68% dos homens estavam ocupados (sei, sei!). Essa taxa era de 69% em 1996. No caso das mulheres, 46,8% delas estavam ocupadas (ahãn!) em 2006, em comparação com 41,9% em 1996. E, finalmente, um indicativo que deveria estar no Hot, mas coloco aqui como forma de protesto: em 2006, cresceu 1,1% o número de trabalhadores de 40 anos ou mais ocupados no mercado. Eu, que estou nesta faixa (argh!!!), queria era parar e, como Ele, descansar ao final do 7.777º. dia. Nada feito!

domingo, 26 de agosto de 2007

E nem doeu!

Fiz o ENEM (Exame Nacional de Ensino Médio) hoje, domingo, das 13:00 às 15:00 horas. E, para falar a verdade, não doeu muito não. Estou afastado do ensino médio (ginasial, à época) há uns 57 anos e pouca coisa mudou. Foram quatro tipos de provas - branca, amarela, rosa e azul. Já comentei aqui que a mulher é rosa e o homem é azul e, portanto, não sei o que se passou na seleção das cores branca e amarela. Bem, pelo menos não hoje, não posso assumir nenhuma postura discriminatória. O tom dominante da prova, de 63 questões com cinco alternativas cada, foi sobre a diferença e as consequentes discriminações, sejam políticas, religiosas, sexuais, econômicas. Já no questionário socioeconômico, imenso, de 223 questões, que deveria ser respondido em casa e entregue no ato da entrada em classe, o INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), vinculado ao Ministério da Educação e responsável pelo ENEM, dava uma mostra do que seria a prova. Para mim, ficou claro que algumas questões predominaram: o tema da redação foi sobre as diferenças (todas e você deveria optar pelo tom e contextualizar o debate). Nas demais questões, as discriminações (indígenas, negros, gays, pobres etc.) também foram abordadas. Outro assunto bastante presente foi o aquecimento global e, por fim, o etanol, com um resgate rápido do tom patriótico "O Brasil é o país do futuro!". INEP é governo e o PT aposta no etanol, pois não? Numa classe com mais de 30 Sérgios, uns 15 faltaram, o que caracteriza uma abstenção alta. Não sei se isso ocorrerá em todo o País. A estimativa é que mais de 3,5 milhões de pessoas prestassem o ENEM hoje. Segundo me disse Valéria, a fiscal da minha classe, "se fosse concurso público, vocês (os presentes) estariam feitos". De qualquer forma, gostei da prova. Não gostei das contas de matemática que, claro, não consigo resolver e muito menos da última questão, que era sobre uma ilustração de Echer (voltarei ao assunto em posts futuros) e como um carpinteiro poderia fazer um objeto tridimensional com algumas ripas de madeira. Odeio matemática, sobretudo quando envolve geometria e cálculos espaciais. Ah! Por que prestei o ENEM? Porque quero me desafogar da mensalidade da minha faculdade e, para obter uma bolsa, preciso passar pelo Prouni e, para chegar ao Prouni, tenho que ter o número do ENEM. É burocrático, sim, mas, como disse, não doeu! Me desejem boa sorte!

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Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

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