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sábado, 29 de janeiro de 2011

The book is on the table

Nos 15 dias que estive de férias entre o final do ano passado e o início deste, aproveitei, como sempre o faço no meu tempo livre, para dar cabo de alguns livros que ficaram relegados à poeira.


Antes que eu desse cabo de todos, alguns deram cabo de mim pela força. Mas, eu não me canso. Insisto em navegar nas linhas, na literatura que tenta explicar tantos porquês, tantos hiatos, dúvidas, traições, comportamentos.


Dos cinco livro que li, três foram suficientes para me causar inquietação, que é o que busco nos livros. Que me façam pensar e, se possível, ir além, cada vez mais além da mediocridade. É nos livros, sempre, que encontro um sossego ante o desassossego da vida cotidiana. Embora pareça uma contradição, ainda que o livre gere novas e desavisadas reflexões, é no terreno da literatura que melhor me encontro. Aos livros.



 - 2666 (Roberto Bolaño - editora Companhia das Letras - 852 páginas): esse catatau de páginas, na verdade, não é apenas um, e sim cinco livros. Embora inacabado, é considerado a obra-prima do escritor chileno, morto precocemente aos 49 anos. Originalmente, foi concebido para ser cinco livros diferentes. Com a saída de Bolaño de campo, talvez os editores acharam melhor concentrar tudo num só lugar. Inacabado ou não, um ou cinco livros, é, realmente, um livro de fôlego, o qual se lê sem fôlego horas a fio. Nem vou dizer que se lê esse livro sem parar porque não é verdade. Comecei lá atrás, em meados de 2010, e somente o concluí ao raiar deste ano. O nome do livro, 2666, é um mistério. Não houve tempo hábil para que o escritor o explicasse e pipocam hipóteses. Mas, o que importa mesmo é que o livro é, sim, muito bom. Começa com a investigação de um escritor recluso, passa por uma série de assassinatos no México e termina com a história do misterioso escritor. Muito bom. Leia.




- Lugar (Reni Adriano - editora Tinta Negra - 111 páginas): tamanho, efetivamente, não é documento. Com 1/8 de páginas em relação ao 2666, Lugar é uma pequena obra-prima do escritor brasileiro que foi revelação em Minas Gerais em 2009. É um livro mítico, de mitos fundadores, da violência com que se engendram os mitos. É reinvenção da roda, da língua portuguesa, da literatura brasileira. Novidade sim. Novo. Desde já, clássico. Recomendo muitíssimo. As palavras não são emitidas. São escandidas. Feito barba cerrada. "Cale-se! Afasta de mim esse pai". A ressonância com Chico Buarque, o diálogo que se empreende em níveis duros, profundos. O livro, parece, foi forjado em ferro. Manualmente.




- A Guimba (Will Self - editora Alfaguara - 331 páginas): depois do maravilhoso 'O Livro de Dave', Self volta com este romance irônico sobre o mundo do politicamente correto em que somos despidos nos aeroportos para ir e vir e, sem o direito de ir e vir livremente (estamos presos à liberação ou não de vistos), faz uma metáfora angustiante dessa nova realidade mundial. Não é uma nova ordem mundial. Antes, é uma desordem mundial, que pode ser iniciada com a ponta de um cigarro, a guimba. Self, uma vez mais, é brilhante ao descrever um mundo que, se ainda não é assim, não tarda em sê-lo. A continuar nesta saga, com um olhar avassalador sobre a in/evolução da humanidade, por certo estaremos condenados a nos fecharmos cada qual em claudicantes celas. Preocupante. Livro necessário para entender as dimensões que o 11 de Setembro deu ao mundo.




- Pegando Fogo - Por que cozinhar nos tornou humanos (Richard Wrangham - editora Zahar - 22 páginas): considerado um dos 100 melhores livros de 2009 pelo The New York Times, o livro investiga o que seria da evolução humana sem o fogo para cozinhar a nossa comida. É, antes de tudo, um trabalho científico, de investigação antropológica e sociológica, e avança ao complementar teses de Charles Darwin e de outros cientistas. Wrangham defende a tese de que começamos a cozinhar antes de nos tornarmos homens e que nos tornamos homens justamente porque passamos a cozinhar. O domínio do fogo há um 1,8 milhão de anos, mostra o livro, mudou completamente a história da humanidade e de nós mesmos, humanos atuais. Que somente o somos porque aprendemos (com nossos antepassados, que ainda não eram homens) a cozinhar. Interessante.




- A Cozinha a Nu (Santi Santamaria - editora Senac - 277 páginas): Sanatamaria é um chef espanhol, defensor aguerrido da comida e dos ingredientes naturais. Refuta modernismos, entre os quais a cozinha molecular de Ferran Adrià (que, por ora, fechou o festejado El Bulli, por prazo indeterminado, e também perdeu, no mesmo El Bulli, a companhia do irmão, que prefere a cozinha tradicional). O chef defende a volta ao campo, aos ingredientes de autênticos terroir e desbanca a indústria alimentícia multinacional - Kraft Foods, Nestlé, Unilever e outros conglomerados que produzem enlatados, conservantes, acidulantes e outros artifícios para vender comida cada vez mais anti-natural. É um verdadeiro manifesto contra uma comida falsa que tem um único mérito: criar pessoas obesas ao redor do mundo numa alimentação que padroniza e iguala a comida do Brasil à China. Excelente.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

2666

Calma, não é um número de candidato a nada. Nem o número da besta em dobro. Tampouco é alguma conta maluca a que eu cheguei ao fazer cálculos mais estranhos ainda. 2666 não significa nada, na verdade. Pelo menos o livro "2666" - Roberto Bolaño - Companhia das Letras - 852 páginas, em si mesmo, não remete a nenhum significado aparente. Se o tem, o número 2666, significado, esse ficou guardado com o autor, que já é morto. Estou a ler o livro há meses. De tempos em tempos, leio um trecho. São cinco romances dentro de um livro. Quero destacar um texto, um textículo pelo qual acabei de passar que muito me agradou:




"Há coisas mais esquisitas que a sacrofobia, disse Elvira Campos, sobretudo se levarmos em conta que estamos no México e que aqui a religião sempre foi um problema, na verdade, eu diria que todos os mexicanos, no fundo, sofremos de sacrofobia. Pense, por exemplo, num medo clássico, a gefirofobia. É algo de que muita gente padece. O que é gefirofobia?, perguntou Juan de Dios Martínez. É o medo de atravessar pontes. É verdade, conheci uma pessoa, bem, na realidade era um menino, que sempre que atravessava uma ponte temia que ela caísse, de modo que atravessava correndo, o que era muito mais perigoso. É um clássico, disse Elvira Campos.


Outro clássico: a claustofobia. Medo dos espaços fechados. Mais outro: a agorafobia. Medo dos espaços abertos. Esses eu conheço, disse Juan de Dios Martínez. Mais outro clássico: a necrofobia. Medo dos mortos, disse Juan de Dios Martínez, conheci gente assim. Se você trabalha na polícia, é espeto. Também tem a hematofobia, medo de sangue.


Certíssimo, disse Juan de Dios Martínez. E a pecatofobia, medo de cometer pecados. E depois tem outros medos, que são mais raros. Por exemplo, a clinofobia. Sabe o que é? Não faço a menor ideia, disse Juan de Dios Martínez. Medo de cama. Como é que alguém pode ter medo ou aversão a uma cama? Pois é, tem gente que tem. Mas isso dá para atenuar dormindo no chão e nunca entrando em um dormitório.


Depois tem a tricofobia, que é medo de cabelo. Um pouco mais complicado, não é? Complicadíssimo. Há casos de tricofobia que acabam em suicídio. E também tem a verbofobia, que é o medo das palavras. Nesse caso o melhor é ficar calado, disse Juan de Dios Martínez. É um pouco mais complicado que isso, porque as palavras estão em toda parte, inclusive no silêncio, que nunca é um silêncio total, não é?


Depois temos a vestiofobia, que é medo de roupa. Parece raro mais é muito mais difundido do que parece. E um relativamente comum: a iatrofobia, que é medo de médico. Ou a ginofobia, que é medo de mulher e de que, naturalmente, só os homens sofrem. Difundidíssimo no México, embora disfarçado com as mais diversas roupagens. Não é um pouco de exagero seu? Nenhum pouquinho: quase todos os mexicanos têm medo das mulheres. Não sei o que dizer, falou Juan de Dios Martínez.


Depois há dois medos que no fundo são muito românticos: a ombrofobia e a talassafobia, que são, respectivamente, o medo da chuva e o medo do mar. E outros dois que também têm um quê de românticos: a antofobia, que é o medo das flores, e a dendrofobia, que é o medo das árvores.


Alguns mexicanos sofrem de ginofobia, disse Juan de Dios Martínez, mas nem todos, não seja tão alarmista, senhora.


O que o senhor acha que é a optofobia?, perguntou a diretora. Opto, opto, uma coisa relacionada com os olhos, na certa, medo de olhos? Pior que isso: medo de abrir os olhos. Em sentido figurado, isso contesta o que o senhor acaba de dizer sobre a ginofobia. Em sentido literal, produz transtornos violentos, perdas de consciência, alucinações visuais e auditivas, e um comportamento em geral agressivo. Conheço, não pessoalmente, é claro, dois casos em que o paciente chegou à automutilação. Arrancou os olhos? Com os dedos, com as unhas, disse a diretora. Puxa vida, disse Juan de Dios Martínez.


Depois temos, é claro, a pedifobia, que é medo de crianças, e a balistofobia, que é medo de bala. Essa é a minha fobia, disse Juan de Dios Martínez. Sim, suponho que seja de senso comum, disse a diretora.


Outra fobia, esta vem aumentando, é a tropofobia, que é o medo de mudar de situação ou de lugar. Que pode se agravar se a tropofobia se torna agirofobia, que é o medo das ruas ou de atravessar uma rua. Sem esquecer da cromofobia, que é o medo de certas cores, nem da nictofobia, que é o medo da noite, nem da ergofobia, que é o medo de tomar decisões. E um medo que está começando a se difundir é a antropofobia, que é o medo de gente.


Alguns índios sofrem de forma acentuada de astrofobia, que é o medo dos fenômenos metereológicos, como trovões, raios, relâmpagos. Mas as piores fobias, a meu ver, são a pantofobia, que é ter medo de tudo, e a fobofobia, que é o medo dos próprios medos. Se o senhor tivesse que sofrer de uma das duas, qual escolheria? A fobofobia, disse Juan de Dios Martínez. Tem seus inconvenientes, pense bem, disse a diretora.


Entre ter medo de tudo e ter medo do meu próprio medo, escolho este último, não se esqueça de que eu sou policial e que se tivesse medo de tudo não poderia trabalhar.


Mas se o senhor tem medo de seus medos sua vida pode se transformar numa observação constante do medo e, se estes se ativam, o que se produz é um sistema que se alimenta a si mesmo, um círculo vicioso de que seria difícil escapar, disse a diretora."


Eu? Padeço de autofobia, que é o medo de si mesmo ou de ficar sozinho, também conhecido como monofobia ou isolofobia. #prontofalei (não que eu não tenha falado antes de 2666 diferentes formas)

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Yo

Já falei aqui algumas vezes mas não custa repetir: um ser humano, dizem por aí, para ser completo enquanto ser, tem que fazer três coisas na vida: plantar uma árvore, ter filhos e escrever (e publicar) um livro.


Dessas três coisas, a única que realizei, nem sei se com sucesso, foi a plantação de árvores. Talvez tenham morrido à mingua, carentes de cuidados. Sei lá. 


Para não delegar a outrem a miséria da humanidade, nunca almejei me ver eterno em ser por mim gerado. E olha que a decisão não é pequena: um leonino admitir que não se quer ver reproduzido num meta-ser é, realmente, um feito.




Portanto, me resta escrever (e, uma vez mais, publicar) um livro. Ideias as tenho mas não sei se valem a pena a ponto de consumir madeira o suficiente e encher as páginas brancas de um volume. Já gasto tinta e caderno o bastante para entrevistar pessoas que, nem de longe, dariam um livro.


Pois tem um cara que admiro cada vez mais (e bota admiração nisso!) que, calculo cá com os meus botões (alguns já caídos e perdidos), certamente plantou uma árvore, reconhecidamente teve filhos (dois) e, agora, se prepara para lançar seu próprio livro, mais conhecido como autobiografia. OK, admito que, muito provavelmente, alguém fez o papel de ghost-writer e escreveu para ele. Também pode ele mesmo ter escrito, já que, de uns tempos para cá, é visível que o rapaz anda com as próprias pernas (!) e pensa com o próprio cérebro. Pelo menos ele mesmo afirma que escreveu.


Falo de Ricky Martin, ex-Menudo que, à maneira de Mark Wahlberg, um dos componentes da formação original da banda New Kids on the Block, pulou daquela profissão (de cantores aborrecentes) para uma outra fase, madura e bem-sucedida. Mark, na minha opinião, tornou-se um ótimo ator. E Ricky? Ricky tornou-se um ótimo homem, pai e cantor. Bem, cantor não sei. Mas gosto dele.




Pois Ricky anunciou que sua autobiografia, "Yo" (Eu), chega às livrarias - em espanhol e inglês - em 2 de novembro. O livro aborda, segundo o próprio Ricky, decisões fundamentais da sua vida, como o fato de se assumir homossexual. Explica a iniciativa de se tornar pai e porque se engajou na causa humanitária que ajuda crianças em todo o mundo que sofrem maus tratos.


Se Ricky tem toda a pinta de bom-moço (e nem falo da aparência, hein!), Mark é o vilão. Adolescente, o New Kids on the Block era um vândalo. Aos 15, fazia parte de um grupo que arremessou pedras em estudantes afro-americanos. Aos 16, assaltou uma farmácia e deixou um homem cego. Cumpriu apenas 45 dias de prisão. Com 21 anos, fraturou a mandíbula de um vizinho.


Mark ficou mais conhecido pelos anúncios das cuecas Calvin Klein que protagonizou. Não sei da vida de Mark, se é pai ou se plantou uma árvore (provavelmente, arrancou alguma para usar como arma). Mas também ele, imagine, lançou um livro. OK, em coautoria com uma fotógrafa. Mas o fato é que o danado tem um livro no currículo. No prefácio, escreveu "Gostaria de dedicar este livro ao meu pau". Fofo!


O que importa é que, por serem ambos, Ricky e Mark, personalidades, por isso mesmo têm suas respectivas vidas públicas e, ao olhar para a trajetória de ambos, não deixo de me admirar de como as pessoas avançam (algumas retrocedem). Em conversa com um taxista, ele me disse que teve um estalo - tum! - e, de quase alcoólatra, resolveu parar de beber ao pensar que, de repente, poderia perder a vida e deixar de acompanhar a vida da própria filha, de cinco anos.


É isso. Yo también creo que hay un estalido - plum! - y todo el resto se olvida y se convierte en nada. E vive la vida, loca o no.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

O reino da pequena literatura

Era uma vez um planeta. Azul. Habitavam lá alguns bilhões de seres. Que, se bem contados, chegavam, certamente, a trilhões. Viviam em desordeira harmonia ou desarmoniosa ordem. Ora a cair, ora a levantar, os seres juntavam-se, dispersavam-se, acorriam quando um deles morria subitamente e acorriam também quando um deles nascia. A eles, se lhes parecia que tanto a morte quanto a vida eram surpresas. Não haviam dominado, portanto, a técnica da frieza e da vã filosofia de ver e crer. Ver a vida e crer que aquilo era convencional. Assistir a morte e lhe avaliar como um fim justo. Era sempre a mesma coisa: vida! Ohhh!!! Morte! Huuuuhhh!!!


Esses seres, certamente, tinham um problema. Sério, na minha prosaica avaliação. Avaliação essa, por decerto, contaminada, visto que eu mesmo estava entre aqueles seres. Portanto, assim, qualquer ato julgatório deixa de ser fiel se participo da trama e tramo contra ela.




Mas isso é uma avaliação minha e eu a faço como bem desejar. E quem quiser que conte outra. O Google contou. Maldito Google. Num futuro antevisto por um escritor do naipe de Will Self (google, by the way). Ah! Uma pausa: Will Self, numa tradição liberal (a faço como desejar, sem usar Google Translate), seria algo como por si mesmo se fará. Combina com ele. Reward and play: num futuro antevisto por um escritor do naipe de Will Self (google, by the way), o Google será deus. Tenho certeza. Ao buscador e empresa de software serão atribuídos poderes de vida e morte, a propósito do estranho estranhamento humano ante nascimentos e falecimentos. O Google terá poderes inimagináveis por ora. Se não for o Google, outra empresa com tendências equivalentes o fará.


Pois que o Google contou. Uma conta mundial. Cheia de tabulações, contas de reduzir, adicionar, variantes, raízes quadradas, noves fora e chegou a um número: 129.864.880. Até o último domingo, dia 8, era esse, de acordo com o modo google de calcular, o número de livros existentes no mundo. Livros, aqui, quer dizer títulos diferentes. Portanto, existem quase 130 milhões de livros diferentes publicados em todo o planeta que, visto de cima, parece, é azul.


Numa Terra que tem 6.861.601.621 (pouco antes da meia-noite desta terça-feira, 10 de agosto), há um livro para cada 0,0189 habitante. Colocado de outra forma, não chegam a 2% o total de livros em relação aos habitantes desse planeta em que os seres são bilhões - se bem contados os considerados 'burros' como animais, vegetais, eis que se chega aos trilhões referidos acima.


Portanto, grassa a estupidez. Não é coincidência. É fato. Leio de 5 a 6 livros por mês e mesmo que lesse de 500 a 600 ou 5.000 a 6.000 a cada semana, não daria conta de reduzir a montanha dos 'sem-literatura' que forma a estranha Babel deste mundo que, se diz, é azul.


Eu o diria, esse mundo, translúcido. Transparente. Falto de impressão, de letras, palavras, orações, frases inteiras. Impressas. Portanto, falta impressão no mundo. E dada a falta de impressão, a impressão que se tem é que nada se expressa. Tudo se exprime, se espreme. E o único caldo que resulta disso é uma tinta que vai rio abaixo, sem a menor possibilidade de preencher brancas páginas, translúcidas mentes de bilhões. O mundo, meu(minha) caro(a), não é azul. É zebrado. De tanta inconsistência e de tanta falta de literatura. Se as pessoas lessem, o mundo seria branco no preto, tinta na página. Consistência. O mundo é um breu!

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Adeus, Saramago!

Goste-se ou não da literatura e até mesmo da pessoa de José Saramago, morto nesta sexta-feira, 18, aos 87 anos, o fato é que o escritor português - feito escritor à idade maior dos 50 anos - renovou a literatura da língua portuguesa - e incluo aqui todos os países de língua portuguesa, os oito que falam e adotam essa língua.




(foto feita pelo fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, que era amigo de Saramago, no exílio cinzento de pedra do escritor em Lanzarote, Ilhas Canárias, Espanha)


Eu tomei conhecimento de José Saramago pelo livro "Ensaio Sobre a Cegueira", em 1995. Estava ainda a cursar a faculdade de jornalismo e existia ainda a livraria Belas Artes, no finalzinho da Avenida Paulista, quase confluência com a Rua da Consolação, aqui em São Paulo.


Costumava peregrinar pela Paulista avenida e quedar-me nas estantes da livraria a descobrir, a cada semana, um semblante novo nas capas dos livros. Foi quando fitei Saramago pela primeira vez. Digo fitei como se o tivesse visto porque, a mim é que não me enganam, os livros mostram mais do autor do que seus próprios retratos e até mesmo faces.


E cativou-me Saramago com aquela literatura sem fôlego (os livros do autor conservam a grafia de Portugal). Aos borbotões, Saramago despejava de um tudo: angústia, medo, vida, morte, ódio, amor. E da mesma forma, quase sem respirar, o bebi. Traguei grandes goles. Seguiram-se "A Jangada de Pedra", "Memorial do Convento" (admirável), "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", "Todos os Nomes" (de onde adotei o fio de Ariadne), "A Caverna" (prefiro o original de Kafka); e "As Intermitências da Morte". Li exatamente nessa sequência: de 1995 a 2005, foram dez anos da literatura portuguesa que se me entrou pelo cérebro e poros.


De Saramago tenho, desde então, sabido muito. Que é isso e aquilo. Que acredita nisso mas não naquilo. Que pensa tal coisa mas não a outra coisa. Primeiro Nobel da literatura portuguesa, em 1998, talvez o vulto de Saramago 'nobelizado' tenha encoberto o primeiro Saramago que eu li, lá atrás. Ao ler "A Caverna" e depois "Intermitências", descobri que já os borbotões tinham transformado-se em burburinhos de riacho doce, daqueles que passam de mansinho por debaixo de cálidas sombras verdes.


Perdi o tesão como sói acontecer quando as paixões se aquietam. A excitação não é mais a mesma e as demandas diminuem até virar um fiapo fininho daquilo que um dia foi uma erupção de um vulcão milenar.


Mas olha lá que não estou a desprezar o morador daquela pedra Lanzarote. Cinzento o local que escolheu para se exilar, tornou-se, com o tempo, pedra e cinza ele mesmo, tenho a impressão. Antes disso, porém, para mim foi o magma. Por muito tempo, forjou o meu cimento. Adeus, companheiro lusitano.


Reproduzo abaixo um texto de "A Jangada de Pedra", no qual Portugal se desprega das franjas da Europa e vai singrar Atlântico afora. Tem sido assim, com os portugueses, desde sempre, a singrar mares afora. De vez em quando, uns vem dar nos costados do Novo Mundo. Foi assim com os antigos e foi assim com Saramago também, que tantas vezes esteve entre nós:


"(...) Entretanto, desesperados, no limiar da surdez, os habitantes tinham espalhado pelas ruas e praças da aprazível estância balnear, agora estação infernal, dúzias de bolos de carne envenenados, método de simplicidade suprema, cuja eficácia tem sido confirmada pela experiência em todos os tempos e latitudes. Por junto, não morreu mais que um cão, mas a lição foi logo aprendida pelos sobreviventes, que, em um instante, latindo ladrando e uivando, se sumiram nos campos arredor, onde, sem motivo que se percebesse, em poucos minutos se calaram. Quando os veterinários enfim chegaram foi-lhes apresentado o triste Médor, frio, inchado, tão diferente do feliz animal que acompanhava a dona às compras, e que, por ser já velho, gostava de dormir ao sol, sem cuidados. Porém, como a justiça ainda não abandonou por completo este mundo, decidiu Deus, poeticamente, que Médor morresse do bolo preparado pela dona bem-amada, a qual, bom é que se saiba, tinha no pensamento uma certa cadela da vizinhança que não lhe saía do jardim. O mais velho dos veterinários, diante do fúnebre despojo, disse, Vamos autopsiar, e realmente não valia a pena, porquanto qualquer habitante de Cerbère poderia, se o quisesse, testemunhar a causa mortis, mas o fito oculto da Faculdade, como na gíria do serviço secreto lhe chamavam, era proceder, disfarçadamente, ao exame das cordas vocais de um bicho que, entre a mudez por morte agora definitiva e o silêncio que parecera ser para toda a vida, tivera afinal umas horas de fala e pudera ser igual ao comum dos cães. (...)".

sábado, 24 de abril de 2010

The book is on the table

Meu último post nesta seção foi no dia 12 de dezembro do ano passado. Lá se foram quase cinco meses e a impressão que dá é que não li nesses meses. Ledo engano. Pode faltar tudo na vida. Arroz, feijão e pão. Só não quero que me falte a danada da cachaça literária. Isso nunca.


Apenas para registrar, quando viajei no final do ano, levei comigo seis novos livros e os devorei em pouco menos de 15 dias. Depois, de janeiro para cá, devo ter comprado, por cima, uns 25 novos livros. Eu havia reservado esses livros novos, já lidos, para resenhá-los na seção.


Mas, na mudança de apartamento, misturei novos recém-lidos com outros, novos e velhos, mais remotamente lidos. E fiquei sem referência porque, confesso, me deu preguiça procurar livro por livro em ordem cronológica (tenho o estranho costume de colocar a data de aquisição na primeira página e fazer comentários codificados aos quais somente eu tenho acesso).


Mas não posso deixar de registrar ao menos dois dessas quase três dezenas de livros. Um era um clássico e eu nem sabia. E adoro o prazer que a literatura me dá de me introduzir o novo, sendo o novo um clássico que eu desconhecia. E adoro também o novo, que, por forte teor literário, nasce clássico, numa heterodoxia que apenas a literatura, no meu entendimento, consegue operar.


O clássico ao qual me refiro são os "Contos Completos" - Flannery O'Connor - editora CosacNaify - 715 páginas. Veja a data da aquisição: dia 6 de fevereiro deste ano, dia em que eu estava simultaneamente desalentado e animado. Desalento por decursos da vida que, de vez em quando, nos atira ao relento e lá nos deixa, a sofrer as intempéries de céus e infernos. Animado porque, como se eu fosse um peixe, fui içado daquele pontual poço e trazido à superfície para me equilibrar novamente. Um mês depois, eu mudaria de apartamento. E, dois meses depois, eu mudaria do trabalho em casa, na versão freelancer, para o trabalho da redação, de volta ao convívio dos demais mortais. Céus e terras mudaram, portanto.




Volto ao livro porque, por não escrever com tanta frequência por aqui ultimamente, tendo levemente às divagações. Flannery O'Connor nasceu em 1925 e morreu em 1964. Menos de 40 anos e uma bela obra que os EUA legaram à literatura. Para mim, ler cada um dos contos foi como ouvir o lamentoso jazz, o soul, e algumas influências do folk do sul dos EUA - o "cinturão bíblico".


Os contos de O'Connor, ela mesma uma católica praticante, são estranhos. São permeados pela sombra que ainda pairava no país pós-abolicionista (a escravidão, nos EUA, acabou oficialmente em 1865). Mas os negros continuam escravos dos brancos e assim são vistos. Em alguns contos, trata-se de substituir a mão de obra escrava pelo estrangeiro com prejuízo para o europeu que é visto com desconfiança.


Ao lado do escravismo que se sente em cada conto (e a autora não toma partido, em absoluto, de qualquer lado que seja), há também um fundamentalismo religioso em que todas as ações são relacionadas ao Deus todo-poderoso que há de fazer a convergência de todas as almas, negras e brancas.


Os contos são violentos e crus. Ao contrário do que esperaria de uma autora conservadora e rigidamente católica, o que me passou é que não remissão. Não há perdão para a humanidade. Há, sim, crime e castigo. E sobre o jazz e o soul a que me referi é porque, a determinada altura, tudo parece se transformar num lamento. O lamento que se faz sobre a obra imperfeita que é a humanidade. O lamento de saber que não há como mudar isso. O lamento de chorar sobre isso e sobre si mesmo, dado que a nós nos é dada essa autoconsciência impiedosa. O'Connor é muita coisa mas não é piedosa.


E a autora me chamou tanto com seus jazz e souls que esperei por dois meses, a navegar no Atlântico, a obra "Tudo o Que Sobe Deve Convergir", nome de um dos contos mais impiedosos da obra de O'Connor. Bem, admito que certamente a autora me enfeitiçou porque foi com desprazer que constatei que o livro vindo de Portugal apenas repete alguns dos contos presentes em "Contos Completos". Apenas alguns mudam de nome na transição linguística entre Portugal e Brasil. Para, finalmente, convergirem, ambos os livros, numa coisa só. Oras! Manterei os dois para me lembrar da minha ansiedade quando se trata de livros. Mas, sobretudo, leia O'Connor, não importa se na edição brasileira, portuguesa, norte-americana ou russa!


E os russos, ainda que gélidos e chegados à vodca, sempre estarão no meu coração literário. Antes, no dia 30 de janeiro deste ano, encontramo-nos, o russo e eu, numa prateleira da Fnac. A capa mais pareceria, à primeira vista, uma história boba, quase que primária: um humano com face daquele gato, aquele cujo sorriso se desfaz no ar em "Alice no País das Maravilhas". Mas talvez por conta do sorriso do gato de Alice, fui devidamente convidado a abrir a portinha (em livro, se diz que são orelhas) e ler os indícios daquele estranho mundo gatil. E não emiti nenhum miado de insatisfação. Ao contrário, ronronei ao encontrar excelente literatura. Sim, os gelados e vodqueiros russos nunca me entediam.


O livro é "O Mestre e Margarida" - Mikhail Bulgákov - editora Alfaguara - 453 páginas. O argumento do livro parte do dia em que Satanás e seu séquito chegam a Moscou. É uma alegoria ao regime stalinista, à União Soviética. Pode parecer um realismo fantástico e até parece. Mas o livro consegue se sobrepor a essa definição e devassa um país devastado por um regime linha-dura.




O autor demorou dez anos para concluir o livro, que é a sua obra-prima. Ainda em 1920, teve problemas sérios com a censura soviética e, portanto, escreveu este livro escondido. Doente (morreu aos 59 anos), ditou as últimas revisões à esposa em 1940, poucas semanas antes de falecer. E, 20 anos depois, o livro tornou-se um sucesso na União Soviética e no mundo. Um dos personagens de "O Mestre e Margarida" diz, em algum momento: "Manuscritos não ardem". Pois os manuscritos de Bulgákov não arderam nas fogueiras das inquisições stalinistas mas ardem em chamas no coração ao serem lidos. Excelente!

quinta-feira, 18 de março de 2010

Eruv e a capacidade de se isolar em universo próprio

"Eruv é um conceito judeu, um expediente ritual tipicamente judeu, um golpe baixo em Deus, esse controlador tão sacana. Tem algo a ver com fingir que postes telefônicos são batentes (de portas) e fios são lintéis (acabamentos das portas). Com postes e cordas, você delimita uma área e a chama de eruv e, então, no shabat, é só fingir que esse eruv demarcado é a sua casa.


Assim, você tem como driblar a proibição de carregar objetos num lugar público no shabat e pode ir à escola com dois envelopes de Alka-Seltzer no bolso sem cometer pecado. Com alguns fios e postes e usando de forma criativa muros, cercas, montes e rios, é possível traçar um círculo em praticamente qualquer lugar e denominá-lo eruv.


...concebe-se um artifício que dure até o pôr-do-sol do dia seguinte, uma extensão do grande muro imaginário do eruv. ...um tubo plástico ao lado de dois postes telefônicos para que os residentes possam ir passear com o cachorro sem pôr a alma a perigo."




O trecho acima, mais ou menos reproduzido (mudei algumas palavras para servir ao propósito do post), é do livro "Associação Judaica de Polícia" - Michael Chabon - editora Cia. das Letras - 471 páginas, que eu tenho lido numa morosidade implacável: desde o dia 07 de março de 2009, ou seja, há mais de um ano. Por que? Porque o meu comportamento com os livros é assim: não tem padrão. Ora eu leio num átimo, em menos de 24 horas, um tomo inteiro de 700 páginas, ora fico a ir e vir entre 230 ou 470 páginas de outros volumes. Sou assim e é só.


Mas não é para falar das nuances da minha literatura que transcrevi o trecho acima. E sim do conceito de eruv. Se o autor o identifica como um artifício tipicamente judeu, eu o expando para outras circunstâncias e povos e, inclusive, posso admitir que o praticava, até então, sem saber do que se tratava e tampouco que havia um conceito como esse (eu li esse trecho precisamente hoje).


Porque venho de, pós-leitura, acreditar que eu mesmo construo eruvs à minha volta. Que, ao contrário dos típicos eruvs judeus, não são para evitar pecados e circunscrever o ambiente sagrado do shabat. E sim para circular meu próprio mundo e fechá-lo com cercas e muros feitos de postes e fios que se entrelaçam para, ao final, virar uma teia da qual não saio e ninguém entra.


O meu eruv foi erigido inconscientemente e, tal qual os personagens de Chabon, pode ser expandido na medida em que preciso ampliar os limites do meu próprio cerco. E assim, de poste em poste, de fio em fio, firma-se um eruv imaginário porém real que me detém tal qual cerca elétrica. Ao contrário dos eruvs judeus, no entanto, eu não tenho restrições divinas impostas para que se cumpram os preceitos do shabat e muito menos temo perder a alma por me levar (e não ao cachorro) para passear nos sábados à tarde.


Pior. Meu eruv já tornou-se, em si próprio, o mundo inteiro e eu, por assim dizer, me eruvizei de tal forma que posso atravessar continentes, suponho, sem que incorra no risco de colocar um pé que seja fora das cercanias dessas limitações. Donde concluo que bem eu me converto ao judaísmo e pratique o tradicional eruv na acepção exata do termo ou que pule, atravesse, desconstrua esse eruv que criei sem imaginar que poderia, um dia, ser atingido por tão ampla erupção. Ou erosão. Depende de como você encara tudo isso.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Sonhar é preciso, viver não é preciso

Adapto a frase de Plutarco, "navegar é preciso, viver não é preciso", para o universo dos sonhos. Antes que me corrijam: Plutarco, filósofo e prosador grego que viveu entre 45-120 dC, cunhou essa frase no livro "Vidas", que teria sido proferida pelo general romano Pompeu. Fernando Pessoa apenas a repetiu, conforme o próprio poeta o confirmou. Bem, explicada essa questão literária - e não faz muito tempo eu, que amo demais Fernando Pessoa e heterônimos, acreditava que o poeta português era o autor do verso -, volto aos sonhos.


Tenho estado à volta com os sonhos não é de hoje. É um assunto que me fascina e, como eu tenho facilidade para me recordar dos meus sonhos, lhes tenho investigado mais cuidadosamente de uns tempos para cá.





Por acaso ou não, hoje me chegou às mãos o "Dicionário dos Sonhos" - Zolar - editora Nova Era - 681 páginas. De abacate a zurrar, o dicionário cobre o mais amplo espectro da fase REM do sono. REM significa rapid eyes movement (movimento rápido dos olhos) que é a fase do sono na qual acontecem os sonhos mais vívidos e, talvez por isso, os que sejam considerados mais significativos e, portanto, passíveis de recuperação ao se acordar.


Quando via a edição, corri os olhos (sem REM, porque estava acordado, como você deve supor, e o supõe bem) pelas páginas e procurei logo alguns significados que talvez me sejam mais relevantes. Não digo que acredito no dicionário. Mas também não digo que desacredito. Não sei quais são as bases científicas que pretendem, por exemplo, explicar porque sonhar com Hamlet pode ter a ver com novos ambientes ou com o fato de que você terá seu(sua) parceiro(a) roubado(a) por um(a) rival. Ou porque sonhar com um lenhador pode significar que você terá muito prazer (aliás, até posso imaginar porque, mas acho que nesse caso trata-se de safadeza da minha parte, de Chapeuzinho Vermelho e da vovó).


Freud e Jung bem que tentaram, de forma mais empírica, levar os sonhos para o universo do real. Tenho lido o grandioso livro de Freud - A Interpretação do Sonhos - e muito do que está contido na obra tem validade científica.


Para completar esse nebuloso estado de inconsciência que são sono e os sonhos, por consequência, aos sonhos se agregam muitos elementos da numerologia, que é o estudo das influências e qualidades místicas dos números. Pela numerologia, cada número ou valor numérico é dotado de uma vibração individual que, teoricamente, indica tendências de acontecimentos ou de personalidade. Note que não há evidência científica nenhuma sobre esse tema.


Mas o assunto é mais do que antigo: Pitágoras (sim, aquele do teorema) é considerado o pai da numerologia por alguns numerólogos. Mas o fato é que a numerologia deriva da gematria, um ramo da cabala, que usa o alfabeto hebraico como base. Assim, a numerologia seria uma adaptação dos princípios da gematria para o alfabeto romano. Mas não entendo desse assunto para discorrer fluentemente sobre isso.





Conforme a numerologia, existem dois tipos de números: o número de expressão, que revela as habilidades, aptidões e oportunidades que estão em sintonia com quem a pessoa é e que podem lhe proporcionar mais satisfação, e o número de impressão, que representa como a pessoa é vista pelas outras pessoas, ou seja, com suas características. De forma que a cada letra é atribuído um determinado valor:


1 - AJS
2 - BKT
3 - CLU
4 - DMV
5 - ENW
6 - FOX
7 - GPY
8 - HQZ
9 - IR


Assim, por exemplo, Redneck deve ser desmembrado:


R - 9
E - 5
D - 4
N - 5
E - 5
C - 3
K - 2


Somam-se os números: 9 + 5 + 4 + 5 + 5 + 3 + 2 = 33 e soma-se de novo até reduzir a soma a um algarismo -> 3 + 3 = 6. Portanto, 6 é o número pessoal deste blogueiro, ao menos no codinome.





Sei que, a essa altura, parece uma aula de matemática. Mas retorno aos sonhos e ao referido dicionário. Ao consultar os números, encontrei as seguintes interpretações para os sonhos, conforme o número. Ou seja, se você sonhar com quaisquer dos números abaixo, o sonho significará, conforme o dicionário:


1 - Ambição e paixão
2 - Fim de um romance
3 - Ficará fascinado(a) pela religião (qualquer uma)
4 - Terá grande poder e força
5 - Felicidade no casamento
6 - Perfeição no trabalho (esse é o número pessoal de Redneck, lembre-se)
7 - Será eficiente e ativo(a) durante a vida
8 - Conservação da propriedade
9 - Aflição e inquietação
10 - Felicidade em breve
11 - Enfrentará um litígio
12 - Terá o melhor de tudo
13 - Tratará as coisas com desdém
14 - Sofrerá prejuízos por causa de outras pessoas
15 - Tenderá a ser misericordioso(a)
16 - Felicidade e amor
17 - Desonra e vergonha
18 - Ficará acostumado(a) ao cansaço
19 - Infelicidade
20 - Será rigoroso(a) e severo(a)
21 - Tudo terminará como você deseja
22 - Descobrirá o segredo de um mistério científico
23 - Vingança
24 - Aprenderá um ofício
25 - Nascimento de uma criança inteligente
26 - Os negócios lhe serão muito favoráveis
27 - Será firme e terá boa mente
28 - Receberá amor e afeição
29 - Comparecerá a um casamento
30 - Você se tornará uma celebridade
31 - Está preparado(a) para exercer o poder
32 - Puro(a) em intenções e expressão
33 - Se for homem, será honesto; se for mulher, sofrerá um aborto
34 - Amor pela glória
35 - Harmonia na família e boa saúde
36 - Um gênio nascerá
37 - Afeto entre pessoas que você ama
38 - Terá um desejo excessivo de ganhar
39 - Você sente inveja de outras pessoas
40 - Recepção em um casamento
41 - Reputação abalada
42 - Viagem curta e infeliz
43 - Comparecerá a um serviço religioso
44 - Você se tornará uma pessoa influente
45 - Perda de virgindade (válido para homens e mulheres)
46 - Terá grande capacidade produtiva
47 - Vida longa e feliz
48 - Será julgado(a) em um tribunal
49 - Receberá afeto de pessoa do sexo oposto
50 - Perdão mútuo
60 - Enviuvará, se for mulher
70 - Será apresentado(a) a uma pessoa famosa
71 - Adoração da natureza
75 - Mudança na temperatura do mundo
77 - Receberá favor de uma pessoa amiga
80 - Você se restabelecerá de uma doença
81 - Logo se tornará viciado(a) em drogas
90 - Ficará cego(a) em pouco tempo
100 - Receberá um favor divino
120 - Obterá um cargo governamental
121 - Será louvado(a) pela comunidade
200 - O perigo virá por causa da hesitação
213 - As bençãos virão em breve
215 - A calamidade está por perto
250 - Aquilo que você desejava acontecerá logo
300 - Você se tornará filósofo(a)
360 - Mudança de residência
365 - Os astros estão a seu favor
400 - Fará uma longa viagem
490 - Ouvirá o sermão de um sacerdote
500 - Vencerá uma eleição
600 - Fará tudo à perfeição
666 - Os inimigos estão a armar uma trama contra você
700 - Terá vigor e poder
800 - Será chefe de um Estado
900 - Poderá passar fome
1000 - Receberá clemência
1095 - Ficará abatido(a) por causa de uma prisão
1360 - Sofrerá constrangimento
1390 - Será perseguido(a) em breve


Afe!!! Se acredito? Não sei, pero que las hay las hay. Me ocorre apenas que costumo sonhar com o alfabeto, e não com os números. Não me lembro de ter sonhado com números. Aliás, meus sonhos costumam ser mudos e, até onde posso vasculhar a mente, presto pouca atenção a detalhes do cenário. Sei que se um terço das profecias acima se cumprissem caso sonhássemos com os números, estaríamos muito felizes ou extremamente deprimidos. Ao avaliar os significados, vejo que para toda felicidade há a correspondente infelicidade, inclusive com ameaça de fome, de prisão e de tragédias. Batakorê Ogum, Ogum Iê Meu Pai, Saravá!


sábado, 12 de dezembro de 2009

The book is on the table

Triste como a vida. Assim avalio este maravilhoso livro. "A Solidão dos Números Primos" - Paolo Giordano - editora Rocco - 284 páginas. Li em dois dias. E é a segunda vez que me surpreendo com um escritor italiano da nova geração. A primeira foi com "Caos Calmo", de Sandro Veronesi.





Mattia, um dos protagonistas, é um gênio da matemática. É irmão gêmeo de Michela que, na mesma proporção do irmão, é opostamente deficiente mental. A outra protagonista é Alice, cujo pai quer torná-la campeã de esqui. Ao sofrer um acidente, Alice fica impossibilitada de realizar o sonho do pai.


Mattia e Alice se encontrarão. Um, o primeiro, desenvolve um estranho andar para se fazer notar cada vez menos pelas outras pessoas: caminha com as laterais dos pés e evita todo e qualquer ruído que o seu caminhar possa causar. A outra, vitimada pelo acidente, tem uma perna mais curta e, por isso, caminha de forma manca. Um e outro se completarão em ambos os andares de forma simétrica. Um e outro ocupam o espaço reservado que fica vago a cada passo de ambos.


"Mattia tinha estudado que entre os números primos existem alguns ainda mais especiais. Os matemáticos os chamam de primos gêmeos: são casais de números primos que estão lado a lado, ou melhor, quase vizinhos, porque entre eles sempre há um número par, que os impede de tocar-se verdadeiramente. números como o 11 e o 13, como o 17 e 19, o 41 e o 43. Com paciência para continuar contando, descobre-se que esses casais logo rareiam. Encontram-se números primos cada vez mais isolados, perdidos naquele espaço silencioso e cadenciado, feito apenas de cifras, e se tem o pressentimento angustiante de que os casais encontrados até ali sejam um fato acidental, que o verdadeiro destino seja mesmo permanecer sozinhos. Então, justamente quando se está prestes a desistir, quando já não se tem vontade de contar, eis que se esbarra em outros gêmeos, agarrados um ao outro. É convicção comum entre os matemáticos que, até onde se possa avançar, sempre haverá outros dois, mesmo que ninguém seja capaz de dizer onde, até que sejam descobertos. Mattia achava que ele e Alice eram assim, dois primos gêmeos sós e perdidos, próximos, mas não o bastante para se tocar de verdade."


Na minha fase atual, sinto que sou como esses números primos gêmeos: sei que existe alguém, em alguma parte do mundo, mas, por um lapso - seja de tempo ou do acaso - jamais encontrarei o primo gêmeo. E, se o encontrar, sempre haverá um outro número par (quer dizer, uma outra pessoa) a me impedir de, finalmente, tocar essa outra pessoa. Portanto, isso é triste. E, portanto, o livro é triste. Como a vida.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A interpretação dos sonhos



Nudez pública: indica o desejo de viver com mais liberdade e menos responsabilidade (conforme Sigmund Freud). Ou, melhor, enseja a vontade de mostrar quem realmente somos.


Água: representa o inconsciente (segundo Carl Jung). Se estamos a nadar tranquilamente, significa que estamos prontos para imergir nas profundezas d'alma.


Nadar: a água representa as emoções. Nadar em piscina e, portanto, em águas calmas, representa que as emoções estão tranquilas.





Foram esses os elementos de um sonho - não-recorrente, posto que não me recordo de o ter tido antes ou, pelo menos, se o tive, não o registrei a ponto de lembrar quando consciente - que tive a semana passada e sobre o qual comentei aqui: eu estava na minha rua, e subia em direção à Avenida Paulista, a duas quadras de casa. A uma quadra da Paulista, encontrei com um rapaz que descia a rua completamente nu. Estava molhado e deixava as marcas dos pés descalços pela calçada.


Eu o abordei e perguntei se havia passado a ser comum que as pessoas caminhassem nuas pelas ruas. Ele me disse que sim, que ali, na Avenida Paulista, 900 (prédio da Gazeta), havia uma piscina gigantesca em algum lugar do prédio na qual as pessoas nadavam despidas, completamente nuas. E que, portanto, era usual que as pessoas nas redondezas caminhassem nuas em público.


E que, ao terminarem suas aulas de natação, saiam assim, nuas, a pé, para suas casas. Fui eu mesmo conhecer a piscina e vi que era verdade. Claro que também eu comecei a nadar nu. E, ao sair da piscina e do prédio, fiz companhia para outros colegas de natação que caminhavam para todas as direções - Paulista, Joaquim Eugênio de Lima, Santos, São Carlos do Pinhal, Campinas, Brigadeiro - completamente despidos, apenas cobertos pela água da piscina que ainda escorria de seus corpos. E o sonho se resumiu a isso, apenas.





Em nenhum momento do sonho houve qualquer situação de conotação sexual, fosse desejo, um olhar sobre os corpos despidos ou algum tipo de tara. Nada disso: as pessoas que se dispersavam nuas juntavam-se aos demais transeuntes vestidos e uns e outros - pelados e vestidos - mal pareciam se notar, assim como ocorre com a multidão que se cruza na Paulista o tempo todo. Vestida, por enquanto.


Me lembrei imediatamente do sonho e, desde então, tenho recordado detalhes: a água que escorria dos cabelos do menino que encontrei primeiro, o decalque dos pés na calçada, a piscina gigante no número 900 da Paulista (aliás, um detalhe: estudei exatamente neste prédio, no 5º. andar, quando fiz a Cásper Libero), a cor esverdeada dos azulejos, a água límpida e as pessoas a tomarem elevadores com pisos apropriados e a total naturalidade em mover-se despidas.





Por isso, procurei explicações. Tenho a faculdade de me recordar dos meus sonhos com bastante frequência. E, em alguns casos, me são muito nítidos. Foi o que ocorreu. Conversei com algumas pessoas sobre isso mas ninguém me deu uma explicação aceitável.


Ontem, terça-feira, fui à fnac resolver uma dúvida com o HD portátil que adquiri recentemente e, claro, não resisti, subi as escadas e fui direto aos livros. Quando entro numa livraria, raramente sei o que quero. Mas pouquíssimas, quase nulas foram as vezes em que saí sem um livro ou diversos nas mãos.





Não foi diferente desta vez: comprei "A Educação Sentimental" - Gustave Flaubert - editora Nova Alexandria - 413 páginas -, numa edição capa dura primorosa. E já ensaiava deixar para trás os livros quando me dirigi à seção das ciências humanas - Filosofia, Psicologia, Sociologia. E é sério! Um dos primeiros livros com o qual me deparei foi "A Interpretação dos Sonhos", de Sigmund Freud.


Ainda circulei por entre as estantes antes de me decidir. Na prateleira imediatamente em frente a este livro, estava a obra completa do pai da psicanálise. Me agachei para olhar - são, talvez, uns 30 volumes, que compreendem a obra completa do psicanalista - e puxei um dos 30 ao acaso. E, sem surpresa, retirei exatamente "A Interpretação dos Sonhos", volume X (acho, não me lembro, que vai até 1900). Porque o volume XI vai de 1901 a algum ano entre 1920 e 1930.





Não havia engano. Relutei, peguei o livro (edição integral, não a edição de volumes em separado) e perguntei ao atendente se havia mais algum livro daquele disponível. Não, me disse, temos apenas este. A minha relutância se devia ao fato do livro estar com aspecto de mostruário. Certamente, outros potenciais clientes o folhearam por curiosidade e o deixaram. Entre minhas manias, está a de comprar livros o mais minimamente manipulados por outras pessoas. Quase livros virginais.


Voltei ao atendente e insisti e comparei com as edições em volumes separados. Ele me disse que aquele volume que eu tinha nas mãos era o único e integral. Satisfeito em derrubar todas as eventuais restrições que eu mesmo havia colocado, saí e me dirigi ao caixa do andar de baixo. Não sem antes comprar, ainda, a revista "Prazeres da Mesa", edição de novembro, que as tenho quase todas.


O livro que agora jaz na minha mesa - folheei repetidamente e não encontrei exatamente o significado do meu sonho - é "A Interpretação dos Sonhos" - Edição Comemorativa 100 Anos - Sigmund Freud - editora Imago - 595 páginas. Me custou R$ 115. Claro que eu já conheço o livro, cuja reputação está amplamente assentada não apenas na área de psicologia e psicanálise, mas no sentido mais amplo do conhecimento popular. Sobremaneira, as pessoas costumam relacionar com relativa frequência Freud aos sonhos. "Freud explica", dizem, quando se esquecem de dizer "Deus sabe o que faz". Portanto, o livro e teor não são desconhecidos para mim.





Desconhecido é o fato de acontecimentos circulares e sem aparente correlação terem se encadeado de forma que, agora, lerei Freud à luz do meu sonho. Ou, melhor, lerei a obra mais querida do autor (assim considerada por ele mesmo) com olhos de lince, a apurar os contornos, entornos e significados expressos ou ocultos de cada oração e parágrafo do livro em busca de respostas. Se não para o sonho que pontifica este post, para outras buscas.


Postulo, com isto - a aquisição do livro -, nada mais nada menos do que respostas que, aparentemente, o consciente não mas têm dado. Talvez o inconsciente o faça. E, se não o fizer e me deixar com as minhas constantes e inquietantes questões, ainda assim me adicionará mais repertório. Nem que seja para encher linhas de textos como essas.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O Original de Laura

Mais do mesmo: um neurologista brilhante, mas fisicamente pouco atraente, deprimido pela infidelidade da esposa mais jovem, pensa em cometer suicídio. Abordei essa palavra aí atrás ontem, ainda. Mas aqui é ficção: acontece agora, no dia 17 de novembro, o lançamento de um livro inédito de Vladimir Nabokov, 32 anos após a sua morte. O livro sai nos EUA (pela Knopf/Random House) e na Grã-Bretanha (Penguin), depois de 30 anos de hesitação do filho do escritor, Dmitri, que detém os direitos sobre a obra.





Nabokov, conhecido mundialmente por ser autor de "Lolita", havia dado instruções para que os originais fossem queimados após a sua morte, o que nunca foi feito. Acho engraçado isso de as pessoas deixarem instruções para destruir documentos, papéis, cartas e manuscritos. Se a pessoa quer que sejam destruídos, e não 'vazem' para a posteridade, basta ter em mãos um palito de fósforo e algo próximo de uma pira e proceder ao pequeno incêndio de sua obra. Mas, quando se trata de escritores, tenho por mim que a vaidade fala mais alto e o próprio criador é incapaz de dar fim àquilo que criou.





Assim como acontece com "O Original de Laura" ("The Original of Laura"), Nabokov também quis queimar os originais de "Lolita" e foi impedido pela esposa. Em 1955, "Lolita" daria ao autor fama universal e ao mundo um novo significado da palavra 'ninfeta'. Os manuscritos de "O Original de Laura" foram trancados no cofre-forte de um banco na Suíça em 1977, quando o autor faleceu. São 138 cartões (em papel cartolina) definidos pelo próprio escritor como incompletos. Nabokov disse que depois preencheria os vazios. Obviamente, ou não deu tempo ou o escritor preferiu relegar o livro aos arquivos.


A Penguin Classics deve reproduzir os 138 cartões e transcrevê-los numa espécie de edição manual-industrial. Um dos editores da Penguin disse que o livro é engraçado e sombrio e que explora o "ódio a si mesmo e a vontade de desaparecer". Fúnebre, não?


Como o livro não sai agora no Brasil (espero que saia em breve), fiz o post fora da rubrica "The Book Is On The Table", que costuma assinalar apenas os livros que li, e não as postagens sobre livros os quais desconheço. Porque estar sobre a mesa significa, literalmente, estar sobre a minha própria mesa.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Existe prevenção ao ato de tirar a própria vida?

Estima-se que mais de 1 milhão de pessoas cometem suicídio em todo o mundo anualmente. E as projeções para 2020 são de que esse número chegue a 1,5 milhão de indivíduos. Os dados são da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em 2007, eram 780 mil as pessoas que tiravam a própria vida, o que atribuía ao suicídio mais da metade das mortes violentas na Terra. A taxa de suicídios cresceu mais de 60% nos últimos 45 anos e, numa estatística ainda mais avassaladora, calcula-se que a cada suicida, outras 20 pessoas tentaram mas não conseguiram consumar o ato.


Esses números indicam que acontece um suicídio a cada 40 segundos em todo o mundo e que, a se confirmar a expansão desse tipo de morte, em 2020 ocorrerá um suicídio a cada 20 segundos. No Brasil, não há registros oficiais mas estima-se que ocorram 24 suicídios por dia (um a cada hora). Os especialistas, no entanto, afirmam que a taxa deve ser 20% maior (ou quase 30 suicídios por dia). Ainda no Brasil, os homens são os que mais cometem suicídio (três vezes mais do que as mulheres). Mas, por outro lado, as mulheres tentam tirar a vida (sem serem bem-sucedidas) de três a quatro vezes mais do que os homens.





As principais causas do suicídio estão relacionadas a depressão, ansiedade, uso de álcool e de drogas e esquizofrenia. Na edição do jornal Folha de S.Paulo desta quarta-feira, 4, há uma matéria sobre o assunto e uma entrevista com a jornalista Paula Fontenelle, autora do livro "Suicídio: o Futuro Interrompido" - Geração Editorial - 250 páginas. O livro é sobre o pai de Paula, que se matou com um tiro em 2005. A jornalista diz que mais de 90% dos casos estão relacionados a transtornos mentais como depressão e bipolaridade. E que as pessoas que o fazem emitem sinais embutidos em frases do tipo: "A vida não tem mais sentido", "Não consigo entender porque estar vivo" etc.


Paula diz que quando se percebe que uma pessoa quer se matar, deve-se perguntar a ela se pensa mesmo em se matar e levá-la a um psiquiatra que, com complementos químicos (remédios), é o único profissional que pode fazer alguma coisa.





A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), que acredita que suicídio é uma questão de saúde pública, lança hoje uma campanha de prevenção ao suicídio. A ABP distribuirá material informativo para o público leigo, manual de informações para a imprensa e veiculará, em rede nacional, um vídeo institucional de 30 segundos sobre o problema.


Não sei se existe prevenção a esse tipo de atitude extrema. Temo que não. Creio que quem quer se matar, o faz, mais cedo ou mais tarde. E sem emitir sinais. Ou ainda que os emita. Há centenas de casos relatados pelas próprias pessoas na internet (em blogs, redes sociais etc.) que dão todos os sinais de que vão mesmo cometer suicídio. E há aqueles suicídios silenciosos que chocam, causam estranheza e até mesmo preconceito.





(Campanha do Centro de Valorização da Vida - CVV - entidade voluntária que trabalha na prevenção do suicídio e na valorização da vida - veiculada em 1999)


Na minha família, há pelo menos dois casos de suicídio comprovados. Ambos os casos, vistos sob o contexto atual, indicam que as pessoas que os cometeram realmente tinham transtornos mentais. O suicídio é um tema árido e tabu. As pessoas - família e amigos - tendem a se afastar e acreditam mesmo que o suicídio é cometido por pessoas fracas, que 'não tiveram coragem de encarar a vida de frente'. Besteira. Essa é uma resposta um tanto confortável para os que não entendem um comportamento desse tipo, muito mais complexo do que um simples dar de ombros penalizado.


Há uns quatro ou cinco dias, acordei às 5:30 horas sob uma saraivada de gritos que começavam com "Socorro!". Um homem gritava na madrugada e dizia que ia se matar. Obviamente, fez tanto estardalhaço que acordou a família (suponho), os vizinhos e todo o bairro. Em questão de minutos a polícia chegou e silenciou o infeliz. Daqui de casa não dava para ver a cena mas acredito que o homem queria chamar a atenção para um problema específico, e não dar cabo da própria vida.


Quem o faz, repito, simplesmente o faz. Pula de um prédio, se dá um tiro, toma veneno ou remédio em demasia. Não grita, não se comunica. É um silêncio total. Algumas vezes, deixam bilhetes para os parentes e amigos. Outras, nada. Apenas um vazio. Um vazio que fez sofrer a pessoa a ponto de a morte arbitrária ser vista como solução única e um vazio nos que ficam, sob o pendor de uma culpa que nunca cessa. Uma vida que se esvai e outras que ficam, suspensas.


terça-feira, 20 de outubro de 2009

Bedtime or bad time stories: histórias que contam para os adultos dormirem

Histórias para dormir (bedtime stories) ou provocar pesadelos (bad times)? Sabe as velhas canções de ninar? 'Nana neném que a cuca vem pegar, papai foi pra roça, mamãe pro cafezal..." (pode haver variações). Ou a outra: 'Boi, boi, boi da cara preta...'. As histórias têm fundamentos mitológicos e esses mitos estão longe de serem inocentes.





A primeira canção - 'Nana neném...' - pode muito bem significar que a 'cuca' é um monstro pronto a te engolir. O significado sexual é de algo que, antes de te penetrar, te absorve, de forma carnal e visceral. A segunda canção - 'Boi, boi...' - pode remeter diretamente ao mito do Minotauro, do ser com corpo de homem e cabeça de boi, também com forte significado sexual. Ambas são de possessão.






Isso não é uma divagação minha e tampouco o argumento é novo. Qualquer leitura aprofundada de contos de fada (fairy tales), com recorte psicológico, sempre demonstrará que há uma pulsão sexual a mover cada historinha que, aparentemente, é infantil. Mas as histórias infantis são, na maior parte das vezes, de alta carga sexual e, de forma surpreendente, se analisadas, bastante cruéis. Basta lembrar as histórias tradicionalíssimas sempre com uma moral (um aprendizado) a concluí-las.






De forma que, embalados que fomos pelas canções de ninar desde os mais tenros anos, nos acostumamos a fantasiar com 'cucas' e 'bois de cara preta' como entes monstruosos. Que podem ser tanto o feminino (cuca) quanto o masculino (boi) a nos atormentar, precocemente, como duas entidades ao mesmo tempo apavorantes e excitantes.






Tanto que, se bem me lembro, dormíamos com um olho aberto e outro fechado. Medo? Sim, claro. Não havia consciência crítica o suficiente para separar a realidade da fantasia. Mas, ao mesmo tempo, talvez pairasse no ar uma certa expectativa de que ambos os 'monstros' convidados a partilhar de nossas inconsciências sonolentas realmente viessem. Como se olhássemos por entre os dedos.






Incapazes de nos conter ante o pavor e, por um comportamento que é tipicamente humano, potencialmente preparados para o ataque primitivo que seria encetado por tais monstros. Querer e não querer. Temer e desejar.







No final, o desejo ficava por detrás das imagens que projetávamos. Um desejo secreto, guardado no nível do inconsciente. Há um livro, 'A Psicanálise dos Contos de Fadas' - Bruno Bettlheim - editora Paz e Terra - 440 páginas, que aborda bem essa questão do imaginário infantil criado de geração em geração à base de mitos.






Claro que nossos pais não sabiam que, ao transmiti-los, estavam a passar adiante, como receberam, códigos e significados que, se aparentemente não passavam de tolas fantasias, no fundamento continham uma simbologia que, por fim, remeteria a questões ditas adultas: sexo, violência, dominação, força, coerção, luxúria, desejos etc. etc.





Assim se dá que as bobinhas histórias que nos contam quando crianças para ir dormir (durante a fase diurna da vida), à noite (fase noturna) essas histórias convertem-se em sonhos do tipo bad. E bad não com a conotação de ruim. E sim com a conotação de 'malvados', quiçá 'sujos', do tipo que assanham, que atiçam e fomentam desdobramentos outros. É quando as bedtime stories passam a ser bad time stories.


Parte disso sempre esteve evidenciado de uma certa forma por revisitas a certos personagens simbólicos de gerações e gerações de crianças. Assim é que Chapeuzinho Vermelho, criança, é uma meiga netinha. Adulta, entende exatamente o 'crescimento' do lobo e consequências advindas desse fato. Oras, o cinema explora isso há muito tempo.





Em continuidade a essa tradição de tirar do mito infantil a áurea de intocável não é de se surpreender, portanto, que a matriarca dos Simpsons, Marge Simpson, em comemoração aos 20 anos do desenho norte-americano, 'resolva posar nua' para a Playboy igualmente norte-americana. Do outro lado do mundo, em Israel, o artista David Kawena fez a mesma coisa e deu conotação sexual a alguns dos personagens de sangue azul da Disney. Príncipes, heróis e imperadores estão para lá de calientes na versão homoerótica de Kawena.


No caso de Marge Simpson, o desnudamento da personagem, na atual cultura pop, era até mesmo esperado. Já a releitura de alguns dos personagens mais famosos da Disney - Aladin, Peter Pan, os príncipes de Zárnia, Troy Boltcon (de High School Musical), Tarzan etc. - reafirma, no entanto, essa vontade de romper com padrões. E de fazê-lo da forma mais voraz: pela leitura erótica.


Recuperam-se, por esse registro, os antigos mitos da infância (e eu falei de mitos e canções brasileiros mas basta mudar as letras e os personagens; tudo o mais será semelhante) revisitados por adultos que ouviram e maturaram esses mitos até dar-lhes, afinal, a conotação sexual que lhes pertencia desde o início. E quem quiser que conte outra.




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Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

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