Cores
Entusiasmado com a exuberância das cores almodovarianas segundo Patty Diphusa, resolvi fazer um post sobre a elegia das cores e de como atravessar esse arco-íris e não achar o pote de ouro no final. É uma espécie de gênesis, de como o caos começa e acaba sem que saibamos.
Cientificamente, a cor é uma percepção visual provocada pela ação de um feixe de fótons sobre células especializadas da retina que transmitem, através de informação pré-processada no nervo óptico, impressões para o sistema nervoso. Um objeto é vermelho, por exemplo, se absorve preferencialmente as frequências fora do vermelho. A cor branca resulta da sobreposição de todas as cores, enquanto que o preto é a ausência de luz. Uma luz branca pode ser decomposta em todas as cores (o espectro) por meio de um prisma, o que dá origem ao arco-íris.
Poeticamente, vemos o mundo em milhões de cores. Cinza, se estamos deprimidos. Preto, se estamos de luto ou cegados pelas inconstâncias emocionais. Cor-de-rosa, se felizes. Verde, quando temos esperança. Azul, quando serenados. Vermelho, quando possuídos pelo diabinho do desejo. Cores pálidas quando doentes ou carentes. Esfuziantes cores quando precisamos berrar ao mundo a nossa felicidade.
A seguir, a história da evolução do mundo, conforme o meu próprio prisma.
O preto e o branco dominavam as paisagens. A vida era árida. Cortante. Não havia movimentos plásticos, a não ser a dança da areia no vento. Fantasmagórico mundo, de sombras. Havia secura. Dureza. Mineral, apenas. A terra regurgitava, ávida. Engolia tudo. Tragava em seco.
O mar veio e serenou a vida selvagem. Ondas translúcidas delimitaram a não-ação do organismo seco. Com a água, o vapor, a chuva, o ameno. Brisas suaves, não mais furacões. Sons de água na pedra. O mineral acariciado pelo líquido.
Um tapete foi estendido. Uma tatuagem para enfeitar a faixa antes obscura. Possibilidades.
O desejo implodiu. O vegetal corrompeu o animal. Queimou e deixou rubra as faces antes intocadas. Caudalosa como os rios de sangue, a cor do desejo colocou matizes faceiras em tudo. Assinalou para sempre a marca da pulsão selvagem. Descontrolada.
Contudo, a civilização não tardou em nos amordaçar. Recalcar os desejos primitivos. Suavizar a compulsão desenfreada. Cabresto.
A inteligência e a sensatez tomaram conta de tudo. Cartesianos, adestrados. Queremos nos rebelar e somos contidos. A profunda cor aniquila vontades indômitas e contém represas.
Mas, não tarda que o desejo rompa barreiras. Devagar, esquenta. Faz cócegas. Atiça. Aguça com raios. Fervemos.
Rompemos em carreiras. Para refluir novamente, esgotados. Cansados das jornadas. Em conchas. Nos fechamos. Sombrios novamente. Até que a paleta seja retomada e retomada e retomada.
1 Comentário:
Lindíssimo. E viva o arco-íris.
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