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quinta-feira, 3 de abril de 2008

Rastreio de Cozinha - 27


As noites de quinta-feira realmente têm sido bastante fracas em termos de conteúdo. Eu sei, eu sei! Há uma obrigatoriedade exigida pelo Ministério da Educação para as grades dos cursos. Mas, realmente, o que a Palestina tem a ver a essa altura na gastronomia? O que é que eu tenho a ver com ovelhas criadas por pastores há 6 mil anos? São figuras de quadros de Rubens. A esta altura, os únicos carneiros que conheço são humanos, conduzidos por pastores mecânicos. Não tem nada de pastoral nos quadros de pintura moderna.

E daí que a pecuária data de 6 mil anos atrás se o meu tempo é este, aqui e agora, mais urgente porque é presente? Hoje, quinta-feira, 3, teríamos as tradicionais aulas de TCC, que para mim passa a ser chamado de "Tentativa de Cabar Comigo", e de Geografia Aplicada à Gastronomia.


Mas, não sei por quais desvios, a tal da geografia nunca que se aplica à gastronomia!!!!

Daí que, como eu disse no post da quinta-feira passada, nós começamos a usar de artimanhas e acabamos por criar uma geografia pessoal que se incorpore ao nosso cotidiano.

O professor que quer acabar comigo, via TCC, faltou. Como em todos os segmentos, sobre tudo o que ocorre pode ser aplicado o princípio de "maximização". Para maximizar a noite e não nos deixar dispersos, foram juntadas as quatro turmas noturnas de gastronomia. Seriam umas 100 pessoas não fosse o fato de haver uma ausência de, pelo menos, metade dos alunos. Vê como ninguém gosta das aulas de quinta-feira?

Como eu faltei ontem, não vi motivo para faltar hoje (o enjôo ainda está aqui, mas, mais contido). Segundo consultoria médica rápida, via telefonema maternal, cheguei à conclusão de que os sintomas são da malvada pressão alta (hereditária). Todos os sintomas casam com sintomas semelhantes lá de casa. 2 + 2 = 4.


Para voltar à tal da geografia pessoal: uma classe lotada, barulhenta, com pouca boa-vontade. Enquanto metade da classe dorme, a outra metade ri, à solta. Ninguém parece perceber que há uma aula em curso. Tampouco eu. Saí umas três vezes da sala. A cada saída, um pretexto. No final, eu já estava no café da esquina.

Nem preciso dizer que a aula foi rápida porque, se nós não aguentávamos mais, tampouco a professora. Enfim, saímos cedo e daí que nos quedamos feito carneiros perdidos, com ar abobalhado. E está aqui uma contradição: em aula, reclamamos. Se não as temos, reclamamos mais ainda, a balir feita ovelhas sem o pastor. Gente! Quanta instabilidade!

Uma amiga explica o fato assim: se viemos para ter aula e não as temos, fica um tempo livre sem ser preenchido. Ou seja, não sabemos o que fazer com esse tempo imprevisto. E queremos porque queremos nos livrar dele o mais rápido possível. É muito contraditório.

Finalmente, vim embora. Cheguei cedo na Paulista. Olhei o relógio do canteiro e resolvi passar na FNAC, que fecha às 22 horas. Hora boa, pouca gente, quase no limite.

Em 10 minutos, sem exagero, comprei quatro livros: "A Elegância do Ouriço", "Giovanni", "Satíricon" e "Nada Te Turbe". Não porque posso. E sim porque não posso. Quando não posso, aí é que cometo o crime. Aos livros que, antes e primeiro, são eles, sempre, meus companheiros, amantes, irmãos, países, religiões, confessionários, sombras, luzes, vazios, cheios, poços ou gêiseres. São, absolutamente, meu mapa astral, austral e territorial.


"A Elegância do Ouriço" (Muriel Barbery, editora Companhia das Letras) é o único dos quatro sobre o qual eu tenho alguma referência, por meio da Special K, do Incompletudes. "Giovanni" (James Baldwin, editora Novo Século) porque gostei da capa e também porque o prefácio é de Paulo Francis. "Satíricon" (Petrônio, editora CosacNaif) porque Petrônio é um clássico e as sátiras e os sátiros estão na memória coletiva muito por conta desse livro. E, finalmente, "Nada Te Turbe" (Susana Pérez-Alonso, editora Mundo Editorial) porque fui atraído pelo título. Há muito tempo não lia essa palavra.

Turbar v.t. Tornar turvo, escurecer, tornar opaco./Pôr em desordem, revolver, agitar: o vento e a chuva turbaram a calma do lago./Transtornar, perturbar./Inquietar, desassossegar./- V.pr. Toldar-se./Fig. Sentir forte comoção, alterar-se: turbou-se a ponto de não ter o que dizer./Tornar-se sombrio, escurecer (a atmosfera)./Fig. Inquietar-se.

Agora, perceba a identificação: a primeira definição é tornar turvo - não à toa, sou natural de São Pedro do Turvo, logo, turvo de nascença; uma das minhas alcunhas é "Alma Perturbada", terceira definição; no sentido figurativo, é alterar-se, o que me ocorre com a mesma frequência que o meu coração pulsa; e, finalmente, tornar-se sombrio, que, em alguns momentos, é um fenômeno natural que se me acomete sem raios e trovoadas, silenciosamente.

No frigir dos ovos (que não os houve nesta quinta-feira, afinal), devo admitir que, às vezes, geografia também é literatura e, se uma ponte leva à outra, a geografia de hoje me levou à literatura e a literatura, provavelmente, me remeterá a outros âmbitos geográficos, até aqui desconhecidos para mim. Afirmo que as não-aulas de quinta-feira têm sido bastante produtivas.

2 Comentários:

Anônimo disse...

Gostei desse novo significado de TCC :)

Ah, boa sorte com as suas lentes e mantenha-se longe de pimentas ou faça aquilo que havia me falado sobre o óleo e etc antes de tocá-las novamente.

Se não se importa, te linkei no meu blog. ^^'

Redneck disse...

Oi Thais, obrigado. Agora, aprendi. E é claro que não me importo. Beijo!

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Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

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