Moro num país tropical
Esta noite de 10 de novembro de 2009 entra para a história do Brasil como um registro a mais no extenso rosário da falta de infraestrutura básica de que carecemos: das 22:15 horas até às 23:40 horas aqui na minha casa, a duas quadras da Avenida Paulista, em São Paulo, faltou uma daquelas coisas básicas das quais somente damos pela falta justamente quando não a temos: a luz, a eletricidade, a energia elétrica que, teoricamente, é dominada pelo ser humano há um certo tempo.
Voltamos ao tempo da escuridão, afugentada apenas pelo fraco fiapo das lamparinas. O único detalhe é que nossas lamparinas, agora, são os celulares: vi, da minha janela, uma série de pessoas a usar o celular para alumiar as ruas e conseguir caminhar. Acho que o último apagão ou blackout dessa magnitude aqui em São Paulo foi em 1999, há dez anos.
Embora eu relate o que vi (ou melhor, o que não vi) a partir daqui de casa, o blecaute atingiu três regiões do Brasil: Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. Foram, ao todo, nove estados. O motivo ainda é incerto mas as primeiras notícias indicam que o apagão foi causado por uma pane na usina hidrlétrica de Itaipu, que alimenta mais da metade do País.
O que me leva à completa indignação é que não há, mesmo depois de apagões recentes, um sistema de redundância que segure as quedas de energia. Sei que no Afeganistão há racionamento de energia e que sucessivas quedas são previstas porque aquele país tem pouca ou nenhuma infraestrutura, aniquilado que foi pelas guerras internas e externas.
Mas, oras, este País aqui, que se gaba dessa tropicalidade sensual e tal, oras!!! O que é isso? Em que mundo estamos? A metade mais rica do País apaga!!! A cidade mais rica da América Latina fica às escuras, feito uma Londres sob ataque aéreo nos anos 40?
Enquanto escrevo este post, a luz teima em emitir ondas ora mais fracas ora mais estáveis. As linhas de transmissão de energia ainda oscilam, portanto. Na rua abaixo do meu apartamento, e em todo o bairro, a região está completamente escura. Pelo histórico anterior, essas pessoas receberão a luz de volta daqui a duas ou três horas.
Moro num país tropical. Sim. Neste momento, está exatamente assim: tropica, tropica e cai. O Brasil parece um bebê babão que começa a andar sobre as duas pernas e, mole, tomba feito um bêbado, incapaz de se animar pelas próprias forças. Prefere ficar sentado e chorar, à espera de braços maternos que o acudam. Que calamidade!
Moro num país tropical que não é abençoado por aquele Senhor, como o dizem. Porque se o fosse, fazia chover aqui um novo dilúvio para recomeçar. Com novas ovelhas, novos burros e novos rumos. Moro num país tropical mas tenho constantes arrepios. Não, não é de frio. É de temor mesmo. De que nada é estável. Que uma pane põe abaixo cidades, estados e um país todo. Welcome to Brazil, visitors! Welcome to the end of world!
4 Comentários:
Estamos de tal maneira "encaixados" na engrenagem da vida moderna, que já não se compadece com "mas", que um apagão incómodo decerto, mas não calamitoso, nos indigna.
Não estou a criticar-te, pois a minha reacção seria porventura idêntica à tua.
Mas liberta lá a eterna balada do Chico, na sua versão original: "vivo num país tropical, abençoado por Deus..."
ai, mas...
queria que tivesse faltado energia por aqui
Oi Pinguim, é que, faz umas duas semanas, a mídia descobriu que estamos a pagar, nos últimos seis ou sete anos, mais pela energia elétrica do que deveríamos, todos nós, os brasileiros. É um erro de cálculo das companhias elétricas, distribuidoras e fornecedoras, e que ficará por isso mesmo, como de resto, tudo o mais que se erra por aqui. Agora, o governo anunciou que quem quiser reaver esses anos todos de contas cobradas a mais, terá que entrar na Justiça e esperar mais cinco ou sete anos até receber a diferença. É por isso que fiquei tão indignado. Abraço!
Mauri, por que??? Fiquei na maior curiosidade. É claro que se eu estivesse muito bem acompanhado, aproveitaria o escuro para transar à luz de velas e tal mas eu estava longe disso: estava no meio de uma matéria e, pluft! perdi o texto e tive que esperar 1:30 hora para voltar a ele. Por fim, trabalhei até as 4 horas da manhã pro conta disso. E a luz oscilou o tempo todo. Abraço!
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