Meu iPhone é dalit
Ao iPhone deve-se a disseminação em massa do modo touchscreen, ou seja, da tela sensível ao toque. Existe o touch antes e depois do iPhone. Disponível antes para alguns outros equipamentos, a funcionalidade do touch popularizou-se com o aparelho da Apple e levou fabricantes de vários tipos de equipamentos - celulares, notebooks, câmeras fotográficas - a adotar a tecnologia touch para seus próprios produtos.
Feliz com o meu iPhone, adquirido em Miami apenas dois meses após o lançamento nos EUA e desbloqueado graças à ação efetiva de um hacker - R$ 100 o desbloqueio, em domicílio -, a despeito de algumas limitações, o iPhone sempre se mostrou bastante eficiente e fácil de operar.
Há pouco menos de um mês, no entanto, o grande atrativo do iPhone começa a deslizar. Não como um slider, porém, próprio de celulares. Para alguns tipos de aplicativos, como o envio de mensagens, a última linha da tela do iPhone não funciona ao toque, ou seja, meu celular touch, descubro agora, pertence à casta dos intocáveis. Sim, aquela que, na Índia, é chamada de "dalit".
O meu iPhone dalit não pode ser tocado em algumas partes sensíveis sob pena de deixar as demais castas, digo usuários, contaminadas pela irritação que acomete um ser humano sempre que o pobre em questão é contrariado.
A intocabilidade do meu iPhone não é tão vasta quanto a que atinge os dalits, de fato. Mas, íntimo da tecnologia e seus meandros binários, sei que a "dalitização" completa do iPhone é apenas uma questão de tempo.
De modo que tenho um touch e não posso tocá-lo. O celular me é, assim, intocável. Eu, de forma irretocável, ainda não tive o ímpeto de atirá-lo na parede porque algo ou alguma coisa me tocou o coração e, sobretudo, as mãos, antes de fazê-lo.
No que me toca, a ausência de touch na tela aonde deveria haver apenas sua maciça presença, o meu aparelho Apple certamente origina-se da Índia. Por algum motivo que desconheço, um dalit deve ter passado ao lado do carregamento no qual estava o meu aparelho. Ao fazê-lo, o tocou com sua intocabilidade e, passo seguinte, transferiu o untouch para mim mesmo, débil destinatário final de um originariamente touch que, finalmente, chega a seus dias derradeiros como untouch.
Na certa, este post não tocará em nada o coração fragilizado de Steve Jobs, já alçado ao intocável Olimpo de maçãs a que Evas e Adãos mortais não lhes toca.
Tudo isso seria corriqueiro não fosse a promessa de tangibilidade embutida no magic touch do iPhone. Como a mais vistosa e antes tocável função do iPhone (un)touchscreen se fecha em clamshell muito apropriadamente, me resta, mui resignadamente, deixar de ser sensível ao TOC (de Transtorno Obsessivo Compulsivo) para t(r)ocar de aparelho e deixar o mundo do touch àqueles que realmente o tocam.
Isso tudo é muito triste, dado que o toque é inerente à minha pessoa e, ainda que não fosse suficiente esse motivo por si só, ainda assim eu tocaria de bom grado outras telas sensíveis que - aqui entre nós - extrapolam o universo dos eletrônicos touchscreen.
Declaro-me, dessa forma, intocável, em casta, cascata e desdobramentos outros que não ouso prevê-los. Me foi negado o direito do toque e, concomitantemente, tenho acesso irrestrito a TOCs outros que não ouso divulgá-los. Sou dalit e, por etapa, unplugged. Quando me encontrarem, desviem do meu caminho para que a minha sombra não os toquem.
3 Comentários:
Red,
Depois de tantos toques e retoques, achei seu post tocante.
Bjo
La Voyageuse, toca aqui que eu toco aí e a gente faz carnaval de tanto tocar. Beijo!
Red,
Pode deixar que da minha parte, estou tocando. Boa tocada para vc ai!
Bjo
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