Meu rugido dominical
Bobby Henderson tinha 24 anos em 2005 e estudava física quando teve o estalo: criou a Igreja do Monstro de Espaguete Voador (FSM, nas siglas em inglês). Obviamente, era uma piada. Mas, em apenas um ano, a brincadeira ficou séria: foram mais de 20 milhões de acessos no site.
O objetivo de Henderson era protestar contra a teoria do criacionismo, nas escolas do Kansas, segundo a qual todas as coisas, inclusive animais e homens (redundante!), foram criadas por um Grande Arquiteto Inteligente (aka Deus).
Por meio do site da Church of The Flying Spaghetti Monster, Henderson publicou carta aberta aos dez conselhos escolares dos EUA, na qual defendia que o “Monstro de Espaguete Voador” deveria ser igualmente reconhecido como um Ser Supremo que criou o mundo. Henderson alega que a sua religião partilha dos mesmos pressupostos do criacionismo bíblico e que ambas as crenças são baseadas na fé.
Os seguidores de sua doutrina são chamados "pastafáris" ou "pastafarianos" (junção do rastafári e da pasta/macarrão italiano). Alguns ícones da nova religião são baseados na obra-prima de Michelângelo, no teto da Capela Sistina. E as crenças parodiam argumentos usados pelos criadores e defensores do design inteligente (intelligent design - ID, outra asneira - veja mais aqui).
Conforme os cânones da FSM, um invisível e indefectível Monstro de Espaguete Voador criou o universo. O início se deu com uma montanha, árvores e um anão (ãhnn???). A FSM estabelece que o aquecimento global, os terremotos, furacões e outros desastres naturais são uma consequência direta do declínio no número de piratas desde o século XIX. Todas as evidências a favor da evolução foram intencionalmente plantadas pelo Monstro de Espaguete Voador.
Criada por um físico, a FSM força a mão nas teorias. Em outra vertente, a igreja testa a fé dos pastafarianos ao fazer com que as coisas pareçam ser mais velhas do que realmente são. Assim: "Aproximadamente, 75% do Carbono-14 decaiu por emissão de elétrons para Nitrogênio-14, o que significa que este objeto (em estudo) tem cerca de 10 mil anos de idade, pois a meia vida do Carbono-14 é de 5.730 anos. Mas, o que nossos cientistas não percebem é que toda vez que eles fazem uma medição, o Monstro de Espaguete Voador está lá para mudar os resultados com seu "Apêndice Macarrônico". Nós temos vários textos que descrevem detalhadamente como isso é possível e as razões por que Ele (sic) faz isso. Obviamente, Ele (sic) é invisível e pode passar através de matéria ordinária com facilidade."
O pastafariano acredita num paraíso que inclui "vulcões de cerveja até onde a vista alcançar" e uma fábrica de strippers. O fiel pastafári também acredita num inferno, que é igual ao paraíso, com a exceção de que a cerveja está "choca" e as strippers têm DSTs. Para finalizar, "RAmén" é a conclusão oficial para as preces e leituras do Evangelho de Monstro de Espaguete Voador e é uma combinação do termo hebreu "Amém" (também usado no cristianismo) e Ramen, um tipo de macarrão japonês (Lámen, Miojo).
A idéia da FSM me remete imediatamente à adoração dos bezerros de ouro, numa outra era, antiga, no Êxodo bíblico. E de como as pessoas se apegam rapidamente a crenças, sejam quais forem. Quando eu estava nos bancos da faculdade, uma professora de antropologia me disse que o homem recorre ao místico porque a vida real é muito árida.
Sendo assim, o homem precisa crer que há algo depois, precisa temer, da mesma forma que temia o fogo antes de dominá-lo. À medida que o homem ficou cético - caíram os bezerros de ouro, o politeísmo do deuses do Olimpo, os profetas, os milagres e até mesmo os santos dependem de uma série de processos draconianos (by Vaticano) para serem eleitos -, perdeu o apelo do divino (eu me encaixo exatamente nesse perfil).
Se a aridez terrena é só isso mesmo, por que vou crer que há algo depois, se quando o que eu preciso é que seja já, que haja uma divinização do humano, aqui e agora? Então, é legítimo criar qualquer coisa para tentar explicar a rotina insalubre da vida real, seja o criacionismo ou o monstro de espaguete voador. O sucesso e a adesão à FSM evidenciam que as pessoas estão mesmo a vagar pelo universo, terrestre ou virtual, à procura de algo que faça sentido.
Claro que a FSM é uma grande piada. Mas, convenhamos, é uma piada autenticada por milhões de internautas que, se, a princípio, riem da teoria, por outro lado, buscam algum significado, nem que seja em absurdos surreais como este. Os altares são outros, o sagrado profanou-se e não há nada para adorar ou temer. Dá uma sensação de vazio, não é?
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