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terça-feira, 22 de julho de 2008

A Vida Secreta das Palavras

Assisti há pouco o filme "A Vida Secreta das Palavras", de Isabel Coixet (roteiro e direção). A sinopse: uma mulher (Sarah Polley) cuida de um homem (Tim Robbins) numa plataforma marítima de petróleo.


A diretora e a atriz já trabalharam juntas em "Minha Vida Sem Mim", tão denso quanto este que acabei de assistir.


O que mais me impressionou não foram as histórias dos dois personagens, e sim o motivo que leva as pessoas a se isolarem numa plataforma em alto-mar por meses. Alguns personagens afirmam literalmente que não conseguem viver em terra firme: "Tenho tremores quando estou em terra firme", diz um dos personagens. Outro diz que é mais fácil viver em meio a tanta água do que conviver com o "resto" do mundo.

Eu moro no nono andar do meu prédio. Às vezes, me sinto isolado como se estivesse numa espécie de torre. Daqui, tenho uma visão bastante abrangente de grande parte da Bela Vista e, com um pouco de esforço, ouço as grandes manifestações que ocorrem na Avenida Paulista. Vejo a 9 de Julho. Ouço eventos do Anhangabaú. E, a despeito de alguns me desacreditarem, até mesmo o barulho de shows do Anhembi.

Nos (raros) dias de pouca poluição e céu limpo, sou capaz de enxergar os contornos da Serra da Cantareira. É uma visão e tanto!

Mas, ainda assim, e com todo o barulho, vida, trânsito, ruídos de cidade grande, me sinto isolado. Só não há o barulho das ondas que batem nas vigas de aço da plataforma, mas, do contrário, quase que me sinto em um oceano infindável.

O filme é bonito. Sim. Ainda que faça concessões à redenção (o que nunca me agrada, né Alessandra!), gostei. Porque os diálogos, o cenário e a cegueira de um dos personagens realçam a vida secreta da palavras, como alude o título.

As palavras é que valem, no final das contas. Na torre/plataforma/nono andar, as palavras não concedem. Antes, contudo, distendem. Estraçalham, esgarçam, ressoam. Doem! E curam!

Foi assim que interpretei o título do filme. Porque, a cada livro que leio e a cada conversa que tenho, percebo mais e mais que as palavras têm vida (secreta) própria. Sim, nós as emitimos, certamente.

Mas, essas palavras podem ser como pássaros, que voam ao longe. Podem ser sinos de bronze que ressoam. Alarmes estridentes. Repetitivos. Podem ser ecos. Sim, têm vida própria. As há, as palavras mais duras, que não morrem nunca. Pairam enregeladas em nuvens que não se dissolvem. As carregamos feito fardos por toda a vida.

Como é mesmo que disse o Bandeira? "Estrela da Vida Inteira"? Acho que era isso. Ele dizia de estrelas, mas, significava palavras da vida inteira. Que brilham mais ou menos, assim mesmo, como nas constelações. Umas que podem ser vistas a olho nu. Outras, nem com potentes telescópios. As há, as palavras, assim como as há, as estrelas, que brilham intermitente ou eternamente.

Fiquei mais atado ao filme pelo nome do que pelo enredo, a princípio. Creio que as palavras impressas na tela com o nome do filme me disseram mais do que os diálogos. E o cérebro, que assim como outras partes do corpo, insiste em ter vida própria, não queria assimilar de forma alguma o nome do filme. Achei estranho. Fui e voltei com o controle várias vezes para lembrar o nome do filme. Por fim, desisti e escrevi. A memória trai, a safada! Está aí outra que deve ter uma vida secreta, separada de mim. Uma vida sem mim, a danada tem.

Aliás, que nomes, esses filmes da diretora! Ambos me tocam. Me fazem viajar no segredo das palavras, em suas vidas secretas e sem mim. Como ousam, suas tolas? Ousam porque estão soltas. Quantas palavras um ser humano fala por dia? E, quando nos calamos, em que dimensões ressoam todos os sons emitidos? Morrem? Anulam-se? Entrechocam-se em ondas magnéticas que se anulam feito prótons e elétrons?

Quantas palavras as há natimortas! As que estão a nascer! As bem-vindas. Esperadas. Ansiadas. Quantas são as não-ditas!

Tenho que dar a mão à palmatória: as palavras têm vidas secretas e, mais importante, vivem por aí, sozinhas, sem dar o menor valor a quem as emitiu. Encontram-se nas esquinas, descaradamente, a zombar de todos nós. Que nossos vocabulários são miúdos para tanta produção, devem dizer, sorridentes!

Minha vida sem mim. Minhas palavras emitidas e nunca mais recuperadas. Perdidas para mim. Será que ganhadas por outrem? Duvido! Desprezamo-as, as que emitimos e as que recebemos. Por isso, rebeladas, estão soltas, independentes, roliças até, de tão flexionadas.

Invejo a vida secreta das palavras. Independem de ar, de água, de calor, do frio. Vivem eternas, soberanas. São as caravanas que passam enquanto as ladramos, selvagens. Indomáveis, riem-se da nossa precariedade rota e com rota traçada: começo, meio e fim.

Porque, até mesmo ao fim, zombam de nós: "Aqui jaz!". Vitoriosas, voam feito anjos felinos, gatos pardos que nem a luz do dia ameaça. Adoro as palavras. As invejo, suas danadas!

4 Comentários:

Gustavo F. Duarte disse...

Exatamente. Não importa quanto sofrimento uma pessoa pode sofrer ou fazer sofrer, nós até as esquecemos, mas as palavras não se esquecem. Belas palavras, as suas, redneck.

Redneck disse...

Gustavo, obrigado pelas suas palavras expressivas. Bem-vindo à blogosfera. Abraço!

Patty Diphusa disse...

Que bom que as palavras têm vida própria. Mas que bom que têm aqueles que as capturam. E vc captura muito bem, amigo. Lindíssimo.

Bjs

Redneck disse...

Patty, que amável de sua parte. Obrigado. Beijo!

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Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

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