Blog Widget by LinkWithin
Connect with Facebook

segunda-feira, 29 de junho de 2009

O pão nosso de cada dia, e o circo, o vinho, o banho, a geladeira, o vaso sanitário...

O governo federal anunciou nesta segunda-feira a prorrogação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para, pelo menos, uns oito setores diferentes da indústria, os chamados bens de capital. Com isso, fica garantido um imposto menor, entre os principais, sobre o pãozinho do café do manhã (e, por extensão, sobre a farinha de trigo), veículos, geladeiras, fogões, vasos sanitários, pias, chuveiros etc. etc.

Teremos alimento, transporte e higiene patrocinados. Afagados assim por bens materiais, talvez que não queiramos mais nada, porque ao espírito, esqueceram de lhe dizer, não sobra nem tempo para calcular o quanto nos vendemos baratos agora para, no futuro, estimar o quão caro isso nos custará.

Porque não tenhamos dúvida: não somos um oásis com mananciais eternos que sobreviverão impunemente em meio a avalanche mundial a que assistimos todos os dias.

Da lista de produtos isentos, saquei alguns itens que parecem mais pitorescos que palhaços tristes em picadeiros de miseráveis circos. Parece que estou a viver de listas, tal a quantidade a que tenho me dedicado, ultimamente, a descrever, laboriosamente. Entretanto, não sou fã dessas relações. É que me surgiram, de repente, em diferentes contextos. Vamos ao listão de isenções:


- Motocicletas de 1 mil a 2 mil cilindradas: depois de apear dos cavalos, que eram nossos principais meios de transporte, tomamos gosto pelos veículos de rodas: primeiro, as carroças, depois, em menor escala, bicicletas. Mais à frente, ainda com pouca abrangência, a classe média começou a motorizar-se. De uns 2 ou 3 anos para cá, a indústria automobilística nunca vendeu tanto e nem tantos andaram tão pouco com carros novos nas cidades congestionadas de artérias movidas a fósseis, sem saber que somos, também, precoces fósseis. As motocicletas, que existem em profusão na China e na Índia, e já são hype no Brasil há muito tempo, deverão cerrar fileiras quais os cavalos de antanho, com a diferença que os coices são mais violentos e o bafio é mais impertinente.


- Banheiras, boxes, pias e lavatórios (de plástico, de porcelana e de cerâmica, que é para nenhuma classe ficar de fora): devemos, os brasileiros, tornarmo-nos o povo mais asseado do mundo, depois desse exaustivo esforço em direção à higiene pessoal individual. Nós, que tomávamos banho de canequinha, de rio ou sob a mangueira d'água dependurada ao ar livre, evoluímos para, afinal, os poderosos banhos de imersão. Pois que se desde os romanos os melhores banhos são assim, por que deveríamos prescindir da banheira, do boxe rigorosamente vedado e de pias e vasos sanitários de porcelana? Pois que se nossos avós e bisavós usavam a 'casinha', problema deles, que não tinham os confortos da 'mudernidade' mundana de hoje, não é? Faltou liberar a isenção para o setor de cosméticos, que quero os meus sais, óleos e emulsões para as 3 horas de banheira que pretendo usar para meu prazer hedonista.


- Portas cadeadas, grades e redes de aço, fechaduras, ferrolhos, dobradiças, gonzos, charneiras e outras ferragens do tipo: eis que depois da Idade da Pedra, do Bronze, do Papel, da Tesoura, do Cimento, do Petróleo, chegamos, enfim, à Idade do Ferro. O ferro, como se sabe da tabela periódica, é um elemento químico que ingerimos por meio de alguns alimentos e, se consumido sem excesso, dizem que faz bem. Creio que a equipe econômica associou esse elemento às minas de ferro, bauxita, manganês, caulim e níquel para se contrapor à crescente incorporação de ferro (metal, não do elemento químico) pelos chineses. É tanto ferro que passaremos a próxima geração inteira com gosto de ferrugem na boca. As construções devem, segundo minha intuição, ganhar peso sobressalente e espero, pelo bem dos potenciais proprietários, que os arquitetos e engenheiros levem em conta esse sobrepeso para que as estruturas (as quais, imagino, serão de ferro) sustentem tudo sem que aquilo que é sólido desmanche no ar.


- Chuveiros elétricos e disjuntores: a eletricidade é, literalmente, o motocontínuo da sociedade e não vejo porque esse ramo deveria ficar de fora. Pois que, de apagão em apagão, ficaremos, quem sabe, apagados de uma vez por todas. Enquanto isso não acontece, é bom que os disjuntores sejam consumidos aos milhares - e o são, dada a má qualidade da transmissão de energia elétrica, com sobrecargas que nos parecem piscadelas e são verdadeiras ameaças a médio prazo - e que os chuveiros elétricos estejam relativamente de prontidão caso as banheiras lá de cima provem-se, por fim, inviáveis, tanto pelos tamanhos diminutos de nossas moradas quanto pela total ausência de praticidade e de tempo para usufruir de um banho de leite de cabra como Cleópatra. Que, na confusão entre disjuntores e chuveiros, se chegue a um bom termo para que um - o disjuntor - não derreta, e faça com que o outro - o chuveiro - derreta a um de nós, por etapa, porque tudo nessa vida não passa de um gigantesco jogo de dominó no qual as pedras pequenas são reduzidas a migalhas pelas grandes e as grandes viram pó sob o peso da própria inconstância inerente a quem se dá mais valor do que o tem realmente.


E sem falar no pãozinho, na geladeira, fogão, máquina de lavar roupas, carros e caminhões. Que somos industrializados, dependentes de máquina (os meus eletrodomésticos os quero em aço inoxidável que, olha só, também receberam seu quinhão de isenção).

Não me estranhe, caro(a) leitor(a), e ao imenso desabafo. É que estou a ver a casa a cair, ainda que a liga (cimento), a estrutura (o ferro) e o acabamento (louça sanitária), aparentemente, estejam garantidos por decreto federal. Um sopro e os castelos, reais e imaginários, penderão feito pequenos arbutos nas encostas dos morros de ventos e chuvas uivantes.

Pois que, jornalista e gastrônomo, vejo que a primeira profissão afunda, em concurso de colegas para entender quem vai à lona primeiro, e que a segunda, sim, tem sobrevida porque, ao que me consta, o alimento do corpo sempre leva a melhor sobre o alimento do espírito.

Não se trata de um lamento particular. Apenas, como jornalista, minha incredulidade tende a crescer feito minha intolerância com esse tipo de aceno paternalista que, de fato, substitui os agrados de políticos de ontem a quem, para ganhar votos, bastavam-lhe arcar com o pão do dia da eleição. Com o eleitorado mais profuso, hoje, há que se lidar massivamente com a massa e nem só de pão vive a massa, pois não? É que estava tudo engasgado na garganta e saiu aos borbotões. Só isso. #Prontofalei!

Seja o primeiro a comentar

Autor e redes sociais | About author & social media

Autor | Author

Minha foto
Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

De onde você vem? | From where are you?

Aniversário do blog | Blogoversary

Get your own free Blogoversary button!

Faça do ócio um ofício | Leisure craft

Está no seu momento de descanso né? Entao clique aqui!

NetworkedBlogs | NetworkedBlogs

Siga-me no Twitter | Twitter me

Quem passou hoje? | Who visited today?

O mundo não é o bastante | World is not enough

Chegadas e partidas | Arrivals and departures

Por uma Second Life menos ordinária © 2008 Template by Dicas Blogger Supplied by Best Blogger Templates

TOPO