Meu rugido dominical
"Quando é que o bambu floresce? É possível esperar a vida toda pela resposta e ainda assim não a obter. O bambu pode florescer apenas uma vez a cada cem anos. Mas, uma vez que começa, todos os bambuzais a seu redor também florescem e espalham sementes e morrem.
Então, pode parecer que o florescimento do bambu é presságio de desgraça. Mas muitas são as histórias de ondas de fome, de homens enlouquecidos pela falta de comida e, de repente, naquele momento, o bambu floresce.
Os ratos do bambu se entopem de sementes e procriam demais; as pessoas esfomeadas os comem e suas vidas se salvam. Sementes suficientes chegam ao solo para dar origem a novas plantas, e o ciclo do homem e sua comida começa mais uma vez.
Portanto, o florescimento do bambu significa tanto o fim quanto o começo." (*)
Uma semente de bambu, quando plantada, permanece obscura por quase cinco anos, exceto por um lento desabrochar de um diminuto broto a partir do bulbo. Durante esses cinco anos, o crescimento é praticamente subterrâneo, invisível a olho nu.
Mas, por debaixo da terra, uma maciça e fibrosa estrutura de raiz se estende na vertical e na horizontal. Então, ao final do quinto ano, o bambu chinês cresce e atinge uma altura de 25 metros.
Não sei se estou no fim ou no começo, mas sinto que algumas raízes estão a crescer no meu subterrâneo e, a longo prazo, será difícil mantê-las abaixo da superfície. Também não sei se estou, dentro dos cem anos, em algum período próximo do florescimento do bambu. O que sei é que estou em transição. O que vem a ser a mesma coisa de começo e fim ou fim e começo.
Esses processos são longos e, por isso mesmo, imperceptíveis. No entanto, há como pressenti-los, ouvir o crescimento abafado que se processa, a expansão milimétrica que acontece e que irrompe em brotos minúsculos, quase invisíveis. Que, contudo, se estenderão em pendões gigantescos, impossíveis de ser ignorados.
Há um outro fato sobre o bambu: a planta verga com a força dos ventos mas não quebra. Ao contrário, assobia quando fustigada pelo vento. Faz da adversidade música. Sou, portanto, neste momento, parte de um ciclo. Raíz, broto e arbusto. Espero florescer em breve para marcar o fim de uma era e o início de outra. Em breve.
(*) Esse trecho foi extraído do livro "O Último Chef Chinês" - Nicole Mones - editora Suma de Letras - 290 páginas.
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