Rastreio de Cozinha - 93
Na segunda semana de aula, começou o troca-troca: temos um novo professor de Enologia e Enogastronomia. Como sempre, os motivos que levaram à substituição não estão bem claros. É incrível que nós, alunos, somente sabemos disso no momento da aula, com o novo professor.
A minha faculdade tem um projeto explícito: tornar-se a faculdade-referência em gastronomia até 2010 (em apenas dois anos) num universo de 14 faculdades de gastronomia existentes na Grande São Paulo.
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Numa avaliação superficial, não vejo como isso poderá acontecer dado que os problemas começam com a parte estrutural (classes cujo barulho das ruas não permite que se ouça direito o que os professores falam; banheiros que são, simultaneamente, vestiários, em que você tem que brigar por uma vaga; cozinhas em que faltam equipamentos de qualidade; e, principalmente, ausência de um programa de qualidade total na forma e conteúdo de muitas disciplinas).
Ainda que eu tenha um olhar condescendente, não há como supor que tal nível de qualidade seja atingido em apenas dois anos. A simples rotatividade de professores demonstra o quão longe a faculdade está de atingir a meta: pelo menos três professores do último módulo, no semestre passado, já deixaram a faculdade. Neste último módulo, em duas semanas, um professor já deixou a faculdade.
O problema é que este alto turn over faz com que qualquer iniciativa seja atropelada. Se, na semana passada, o professor antigo de Enologia nos indiciou um determinado material, o novo professor chega com outra metodologia e material. Problema seu se você já adquiriu o material do anterior.
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Ainda esta semana, um dos professores fez algumas apresentações em classe e, para minha total surpresa, um dos materiais utilizados era de uma faculdade concorrente, ou melhor, a mais conhecida faculdade de gastronomia, essa sim com toda a chance de ser (já é) referência em São Paulo. Ou eu me engano, ou um dos diferenciais de uma faculdade que quer se tornar de ponta é produzir seu próprio conteúdo.
Isso sem falar no mais importante: os ingredientes usados nas produções práticas. Por incrível que pareça, passamos batido por feijoada e pela lagosta. A feijoada é o prato nacional por excelência e saber preparar uma lagosta, certamente, é um requisito de um cozinheiro pelo menos médio. Afora a ausência de ingredientes autênticos, em geral substituídos por "clones" locais e bem mais baratos.
A iniciativa de transformar a faculdade em referência é, obviamente, louvável. Mas, é como o próprio Brasil: enquanto não se tratar de problemas estruturais mais prementes, de raiz, não se chegará nunca à almejada qualidade. Que, para mim, começa justamente nas instalações: bom áudio na aula, cozinhas completamente equipadas, vestiários adequados. Tem que ser, no mínimo, um prédio convidativo, o que, claramente, não é o caso.
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Nas duas aulas seguintes, de Gestão de Pessoas e Qualidade, ironicamente, a qualidade não existe, por exemplo. Mal dá para se ouvir o que o professor fala lá na frente (claro que pertenço à facção do fundão). Somos quase 50 pessoas em classe (ou mais). A uma determinada altura, com um conteúdo chato, o que vi foram aproximadamente 25 duplas em conversas paralelas. Nada de qualidade. Pelo menos no que se refere a um dos cânones modernos da cultura contemporânea, a interatividade, somos 100% referência.
(Obviamente, as fotos que estampam este post não são das instalações da faculdade; ao contrário, são o que considero o que deveriam ser as nossas salas e cozinhas)
Nem sei porque, acabei "caindo" no seu blogg hoje e a-d-o-r-e-i o jeito como você escreve! Parabéns! Gostoso de ler, inteligente e bem humorado!
Gostei e vou voltar!
bjs
Alessandra, que esta "queda" te seja leve. Volte sempre que quiser para este poço insano. Beijo!
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