Blog Widget by LinkWithin
Connect with Facebook

sábado, 11 de outubro de 2008

Terreiro ou terroir?

Algumas pessoas nasceram no terroir. Já falei muito sobre o terroir aqui no blog. Conceitualmente, terroir (do francês terroir e do latim terratorium) significava, originalmente, uma extensão limitada de terra conforme as qualidades que dava à agricultura, principalmente quanto à produção vitícola (videiras, uvas).



(Foie gras)

Em gastronomia, o termo terroir é mais abrangente e abarca tudo: vinho, azeite, alimentos, peixes, caça, queijos etc. Assim, o melhor terroir do foie gras é francês, da região de Aquitanes e Midi-Pyrénées (sudeste da França); o melhor vinho é de Borgonha, também na França; o melhor azeite é da Espanha; os melhores currys são da Índia; os melhores peixes, do Japão. São produtos que, conforme o desenvolvimento de cada país ou região, obtiveram certificados de controle de origem, de território, de qualidade, frescor e outras tantas características que os tornam únicos.Mas, e quando não há terroir? Suponho que, nesse caso, há terreiro. Sim, terreiro, quintal, puxadinho, roça. É o caso do Brasil, por exemplo, que detém, na minha opinião, o terreiro de mandioca e da cana-de-açúcar que gera a cachaça, a pinga, a branquinha, a malvada. Ou isso não conta? Claro que sim! 

Somos, o Brasil, um imenso terreirão: descem santos e santos no formato dos mais diversos produtos animais e vegetais. Somos uma profusão de sabores, cores, cheiros. Temos frutas que, dizem, vieram direto do Éden para cá: graviola, cupuaçu, cajá, bacuri, mangaba, jenipapo, jambo, pitomba. Leia os nomes. São poéticos. Terreiro ou terroir?


(Especificações do terroir francês)

Não importa. Sabemos que os índios cultivavam ali, ao lado da oca, o alimento de subsistência. O milho, a mandioca, o milho de pipoca. Quer alimento mais nacional que a pipoca? E a paçoca de amendoim? O pé-de-moleque? Observe, de novo, os nomes. Pululam na boca, só de pronunciá-los. Que terroir, que nada! Terreiro sim.

Terreiro de macumba, de candomblé, de umbanda. Terreiros de festa. Quem não tem, no interior, um terreirinho coalhado de plantas? Cheiro-verde, alguma pimenta, um pé de erva-doce, outro de capim santo. Eu tenho dentro de casa um pé de pimenta malagueta. É o meu próprio terreirinho. Já cultivei salsa, cebolinha e coentro no meu apartamento.

(Hortinha de apartamento)

Se terroir é o modo como principalmente os franceses encontraram para enobrecer os vinhos, queijos e carnes, por que não nos apropriarmos do terreiro como extensão de nossas cozinhas? Por que não resgatar o terreiro da roça que tantos de nós temos registrados na memória rural. A gastronomia brasileira é refratária, ainda, ao culto dos produtos locais (terreiroir, posso assim definir). E quem disse que o jiló não merece o certificado de Identificação Geográfica Protegida (o IGP francês)? Será que o jiló de Minas Gerais não é o melhor jiló do Brasil? Ou será o do Rio de Janeiro?


(Jiló)

O hábito, que vem dos índios, de encontrar farta disponibilidade de frutas, legumes, hortaliças e outros alimentos diretamente da natureza, fez com que nunca valorizássemos a origem de cada ingrediente. Outro dia, assisti a um filme indiano em que havia uma profusão de cores nos mercadinhos mais interioranos. Eram os currys. O curry é tão abrangente na vida dos indianos que cada família carrega consigo a própria receita de curry. É tão bonito isso.


(Curry)

A cada conversa com os colegas de gastronomia, encontro referências aos terreiroirs de cada um: um porco que era abatido no quintal (logo, terreiro), em torno do qual havia uma verdadeira festa; um pão assado no forno de barro, coberto por folhas de bananeira; uma abóbora colhida na roça que se transformava em um exuberante doce de abóbora com coco, ralado na hora. São lembranças que remetem, de imediato, ao terreiroir.

O feijão da mãe, da avó. O alho picadinho conservado no sal. O arroz que era colhido e debulhado em máquinas e voltava, branquinho, para o consumo doméstico. A banha de porco que era mais saudável que os óleos vegetais. O torresmo. O queijo feita por nossas avós. A pamonha. O cural. Alguém ainda duvida que não há terroir no Brasil? 

Algumas pessoas nasceram no terroir. Outras, no terreiro. O que fazer com a terra e dos alimentos dela provenientes depende apenas da memória e do gesto. Decreto, desde já, a criação do Manifesto Terreiroir! Pela apreciação e respeito pelos produtos da terra brasilis. Já!

Seja o primeiro a comentar

Autor e redes sociais | About author & social media

Autor | Author

Minha foto
Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

De onde você vem? | From where are you?

Aniversário do blog | Blogoversary

Get your own free Blogoversary button!

Faça do ócio um ofício | Leisure craft

Está no seu momento de descanso né? Entao clique aqui!

NetworkedBlogs | NetworkedBlogs

Siga-me no Twitter | Twitter me

Quem passou hoje? | Who visited today?

O mundo não é o bastante | World is not enough

Chegadas e partidas | Arrivals and departures

Por uma Second Life menos ordinária © 2008 Template by Dicas Blogger Supplied by Best Blogger Templates

TOPO