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domingo, 30 de novembro de 2008

Meu rugido dominical


Num pequeno percurso hoje, vi uma multidão de almas. Domingueiros que vão e vêm com sacolas, malas, crianças. Que perambulam de um ponto a outro da cidade. Movem-se.


Me pergunto quais são suas aflições, expectativas, cansaços. Todos têm faces de domingo. Pressupõe-se que, porque hoje é domingo, basta que se assente um sorriso à cara, escanhoada ou maquiada, e saia-se com a máscara, transfigurado para o carnaval semanal.

A multidão avança. Ora para o norte, ora para o sul. Esbarram-se. Aglutinam-se e dispersam-se. Centenas de almas a cruzar umas com as outras e donde se extrai uma coletividade, uma semelhança a despeito da diversidade.

Sempre que estou no meio das pessoas me interrogo para onde vão, o que pensam e o que desejam. Claro, vejo desejos pontuais: um olhar mais demorado de um passageiro que paira sobre a passageiro, ou de um homem para outro homem. De uma mulher que suspira, resignada, por outro que não o seu acompanhante. Vejo isso todos os dias.

Mas, em conjunto, o que querem as pessoas? Terão necessidades além das básicas? Vejo os meninos urbanos, em bandos de três ou quatro. Cabelos à moda punk. Óculos escuros, grandes correntes prateadas. Tênis reluzentes. O indefectível celular com o fio plugado ao ouvido.

As mulheres, em bandos maiores, equilibram o conjunto. Riem-se e misturam cores e modas, alheias às combinações possíveis e ridículas. Um esmalte azul, um grande relógio prateado e um óculos de grau que descombinam o figurino.

Ninguém teme o julgamento. É domingo. Famílias inteiras - duas, três crianças. A mãe sempre está com o mais novo no colo. O pai arrasta, ao invés de conduzir. Parecem estranhos, pais e mães. Ambos jovens, cada um pensa um mundo diferente. Vão ou vieram do almoço no caso dos sogros ou dos pais? Uma sacola pequena de bebê e outra, maior, quem sabe com as sobras do almoço, fecham o retrato.

Os velhos, na maior parte sozinhos, homens e mulheres, são os mais admiráveis. Saca-se facilmente que vão de visita. Que ninguém os visita e por isso vão por conta. Trôpegos, em frágil equilíbrio, querem a proximidade dos familiares. Ninguém foi lhes buscar. Que venham sozinhos!, devem exclamar, mau-humorados, os filhos e parentes.

A migração massiva continua e, de tempos em tempos, novas levas vão e vêm. Repetem-se os biótipos, com pouca ou nenhuma variação. Os namorados apaixonados sempre os há. Como os há os solitários, os bravos, os apressados.

Reencontros, despedidas, uns partem e outros chegam. A procissão segue, interminável. Uns com fardos mais pesados - bagagens, crianças, uma pequena aglomeração. Outros, mais leves, desenvoltos, desfilam com o traje de domingo.

Quanto mais eu as vejo, aos domingos, mais eu formo a convicção de que navegar é preciso. Não parar. Para que se questionar o objetivo, se mover-se é um objetivo em si mesmo? E, depois, para que observar tanto e persistir na observação para constatar o óbvio? Que circula-se porque o tempo urge. Que cairá sobre todos feito um manto paralisador! Que caminhe, então, a multidão, com ou sem um fim. Importa que se está no meio.

E que eu caminhe junto com o fluxo, siga e me incorpore ao fluxo. Antes que a multidão, no primeiro momento desatenta, volte-se e mire com um gigante olho esse anônimo que ousa perscrutar suas almas, suas palmas e tecer véus com ideogramas para cada um. Caminhar é preciso porque se está e se é vivo.

6 Comentários:

Anônimo disse...

Este post lembra-me uma canção da Maria Rita que gosto muito chamada "encontros e despedidas" que fala precisamente deste corropio que é a vida! Se não conheces, aconselho-te vivamente a ouvires esta música. Penso que vais gostar!

beijinhos

Ana

Redneck disse...

Ana, eu sou relapso em termos de música popular brasileira e, acredite-me, sou fã dos britânicos em geral - Radiohead, Massive Attack, Blur e outros. Assim, meu conhecimento da MPB é ralo. Claro que conheço a cantora que você cita, mas, nada profundamente a ponto de saber as letras das músicas. De qualquer forma, todos nós acabamos por rodopiar e dizer as mesmas coisas, não é? Beijo!

Anônimo disse...

Já que mencionaste que não conhecias, deixo aqui a letra, quem sabe, pode ser que a ouças um dia:

Encontros e despedidas

Mande notícias do mundo de lá
Diz quem fica
Me dê um abraço, venha me apertar
Tô chegando
Coisa que gosto é poder partir
Sem ter planos
Melhor ainda é poder voltar
Quando quero

Todos os dias é um vai-e-vem
A vida se repete na estação
Tem gente que chega pra ficar
Tem gente que vai pra nunca mais
Tem gente que vem e quer voltar
Tem gente que vai e quer ficar
Tem gente que veio só olhar
Tem gente a sorrir e a chorar
E assim, chegar e partir

São só dois lados
Da mesma viagem
O trem que chega
É o mesmo trem da partida
A hora do encontro
É também despedida
A plataforma dessa estação
É a vida desse meu lugar
É a vida desse meu lugar
É a vida

Quanto aos gostos...Bom gosto!lolol Isto é, já me estou a incluir nesse teu gosto PORQUE sou muito ecléctica e nos meus ouvidos cabe muita música!

Um beijinho grande
Ana

Redneck disse...

Ana, agora que você mencionou a letra, me recordei da música. Foi tema de uma novela da TV Globo, "Senhora do Destino", de bastante audiência aqui no Brasil. Não sei se tu sabes, mas, as trilhas sonoras das novelas costumam fazer bastante sucesso no Brasil. Eu também assisto novelas e, claro, reconheci de imediato a música quando li a letra. Eu gosto muito de quem ouvidos tão ecléticos. Admito que os tenho também a ponto de conciliar música eletrônica com música clássica. Apenas, repito, não me identifico com MPB. De qualquer forma, não sou tão obtuso a ponto de fechar meus ouvidos a outras vertentes, assim como você. Beijo!

Anônimo disse...

Sim, eu conheço a novela. Sim seguimos as novelas brasileiras, se bem que não tanto agora. De qualquer das formas, acho que gostamos de coisas tão diferentes porque somos também complexos e diferentes. Comecei a gostar mais de MPB precisamente por causa das bandas sonoras de telenovelas. Assim, também acho que a exposição a um determinado tipo de música acaba por nos levar a gostarmos, a ouvirmos esse género. O meu comentário não foi de todo uma crítica, só uma observação.Viva à diversidade de gostos, viva à anarquia musical...

um beijo grandeee!

Ana

Redneck disse...

Ana, não tomei seu comentário como crítica, em absoluto. Aprecio por demais a pluralidade para me indispor com a diferença de opinião e muito menos de gosto. Também acho que os gostos sucedem-se conforme as nossas complexidades e, ainda bem que temos tão vasta diversidade. Viva a diversidade, sob todas as formas, musicais ou não. Beijo maior!

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Redneck, em inglês, define um homem rude (e nude), grosseiro. Às vezes, posso ser bem bronco. Mas, na maior parte do tempo, sou doce, sensível e rio de tudo, inclusive de mim mesmo. (Redneck is an English expression meaning rude, brute - and nude - man. Those who knows me know that sometimes can be very stupid. But most times, I'm sweet, sensitive and always laugh at everything, including myself.)

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