Meu rugido dominical
Às 20:12 horas deste domingo, pouco mais de três horas após o término do segundo turno das eleições, tínhamos, no Brasil, a primeira mulher eleita para o cargo de presidente da República. Dilma Rousseff é, portanto, a nova presidenta do Brasil, a partir de 1º. de janeiro de 2011.
Esta eleição foi, sem dúvida, a mais emporcalhada já vista neste País desde a redemocratização, em 1985. O lixo começou a se amontoar no primeiro turno e terminou neste segundo turno como um aterro sanitário saturado. Abutres de todas as espécies sobrevoaram o montulho e ajudaram a colocar mais carniça na montanha de sujeiras em que se converteu a política brasileira.
Não sou militante de partido algum e tampouco me posiciono à esquerda ou à direita do espectro político. Me cobram isso a todo o momento. Como se eu precisasse de um rótulo para dar cabo das minhas convicções. Não, não preciso ser esquerdista ou direitista. Não preciso ser militante ou afiliado. Não preciso estar aliado a qualquer nomenclatura para ter um pequeno discernimento do que acho correto ou não para mim e o meu próprio País.
Me perguntaram muitas vezes em quem eu votaria. Declarei, desde cedo, meu voto em Dilma Rousseff. Não, também não sou lulista. Antes, sou anti-serrista. Sou anti-PSDB. Mas, nem por isso, sou PT. Tenho claramente para mim mesmo que o derrotado candidato do PSDB, José Serra, é um homem cujos princípios beiram o totalitarismo. Contudo, isso não me toldou o suficiente a visão para enxergar que Lula, como militante, era melhor ter ficado calado.
Que desconfio enormemente dos avanços petistas sobre a liberdade de imprensa deste País. Mas, também sei, em larga escala, de uma meia dúzia de vezes que José Serra ligou em pessoa para algumas das redações mais importantes deste Brasil e pediu a cabeça de uma série de colegas jornalistas. E foi atendido.
Não comungo com aqueles que exaltam os feitos do governo Lula, da decantada elevação de 20, 24 ou 27 milhões de brasileiros à classe C. Para mim, em que pesem algumas iniciativas dos oito anos do governo Lula, a atual conjuntura brasileira é uma soma de feitos que se acumula nos 25 anos de democracia neste País. E Lula não fez nada sozinho. Ao contrário, é bom que se recorde que se aliou, inclusive, a pessoas com as quais lutou como Sarney e Collor. Imagina! Chamou de amigos alguns cães que morderam seus calcanhares durante anos.
Então, não tentem me convencer de que o governo Lula é maravilhoso. Acho que é o que é porque, mais do que o governo, quem faz este país somos nós, o povo. E justifico meu voto em Dilma porque acredito que a presidenta tem mais consistência de levar o projeto todo adiante do que o Serra, além das óbvias razões já citadas acima.
Agora, não tenho dúvida alguma de que, em algum momento, quando Lula vestir o pijama, Dilma mostrará a que veio. Talvez não haja uma cisão radical. No entanto, duvido que a intimidade entre Dilma e Lula permaneça nos três primeiros meses de governo.
Não tenho ilusões com políticos e, aqui mesmo neste espaço, já defendi o fim da obrigatoriedade do voto e o faço de novo. Não compartilho da chamada "festa cívica". O que é obrigatório não pode ter coloração de festa.
Ao mesmo tempo, confesso que passei os últimos meses enojado. Dos candidatos, da falta total de compromisso em divulgar verdadeiros planos e, principalmente, das pessoas que, ao me questionarem o voto e receber a resposta, tentaram, por inúmeras vezes, me demover.
De novo: não sou militante. Ainda que eu tenha votado em Dilma nos dois turnos, nunca tentei convencer ninguém das minhas idéias. Acho horrível isso. Eu tenho opinião. Não preciso que me digam o que fazer. E, agora, vejo, já agora, pouco mais de duas horas após a confirmação do resultado, dezenas de pessoas em luto, indignadas, prestes, praticamente e de novo, a se dirigirem ao aeroporto mais próximo e deixar o País. Vão, façam boa viagem! Levem consigo o comportamento paroquial e incivilizado. Odeio esse discurso. Assim como não imputo meu desejo, minhas crenças (ou falta de) ou minhas ideologias (se as tenho, que nem sei), desejo, ardentemente, que não me escarrem esse sentimento pequeno, falto de qualquer civilidade, por serem maus perdedores.
Já perdi muito mais na vida do que um reles voto. E, sinceramente, não é um político locado em Brasília que fará qualquer diferença na minha vida que segue sua rota independentemente (e a despeito) de quem ocupa o cargo de maior projeção política no Brasil. Minha própria vida é maior do que uma eleição. Por favor, os cães ladram e a caravana passa. Sou caravana nessa condição literal: passo pela vida e os cães me ladram e eu os observo e os vejo diminuir de tamanho até sumirem-se com o horizonte. Sou mais eu.