Livro da Criação da Criança (Pequenos Midrashim)
"No início, os pais do homem copulam. Isso cria uma gota na qual Deus introduz o espírito do homem. Em seguida, pela manhã, o anjo leva a gota até o Paraíso e, à noite, até o Inferno, mostrando-lhe onde ela viverá sobre a terra e onde será enterrada quando Deus chamar o espírito nela instalado ... Mas o anjo devolve sempre a gota ao corpo da mãe, e o santo, louvado seja, tranca em seguida portas e ferrolhos. E o santo, louvado seja, diz-lhe: Vai até lá, e não mais longe. E a criança permanece nos flancos da mãe durante nove meses. Depois vem: A criança come de tudo que sua mãe come, bebe de tudo que sua mãe bebe e não elimina excrementos, pois, se o fizesse, causaria a morte da mãe. E depois: E quando chega o momento em que ela deve vir ao mundo, o anjo apresenta-se à sua frente e lhe diz: Sai, pois é chegado o momento da tua aparição para o mundo. E o espírito da criança responde: Já declarei, perante aquele que lá esteve, que estou satisfeito com o mundo em que vivi. E o anjo lhe responde: O mundo para o qual te levo é belo. E depois: À tua revelia foste formada no corpo da tua mãe e à tua revelia nasceste para vir ao mundo. A criança cai no choro. E por que chora ela? Por causa do mundo em que viveu e que é obrigada a abandonar. E, assim que ela sai, o anjo lhe dá um tapa no nariz, apaga a luz acima da cabeça dela, obriga a criança a sair a contragosto e a criança esquece tudo que viu. E mal ela sai, começa a chover." Extrato do livro "As Benevolentes", de Jonathan Littel (Alfaguara, São Paulo, 2007), sobre o qual comentarei quando terminar de ler.