A interpretação dos sonhos
Nudez pública: indica o desejo de viver com mais liberdade e menos responsabilidade (conforme Sigmund Freud). Ou, melhor, enseja a vontade de mostrar quem realmente somos.
Água: representa o inconsciente (segundo Carl Jung). Se estamos a nadar tranquilamente, significa que estamos prontos para imergir nas profundezas d'alma.
Nadar: a água representa as emoções. Nadar em piscina e, portanto, em águas calmas, representa que as emoções estão tranquilas.
Foram esses os elementos de um sonho - não-recorrente, posto que não me recordo de o ter tido antes ou, pelo menos, se o tive, não o registrei a ponto de lembrar quando consciente - que tive a semana passada e sobre o qual comentei aqui: eu estava na minha rua, e subia em direção à Avenida Paulista, a duas quadras de casa. A uma quadra da Paulista, encontrei com um rapaz que descia a rua completamente nu. Estava molhado e deixava as marcas dos pés descalços pela calçada.
Eu o abordei e perguntei se havia passado a ser comum que as pessoas caminhassem nuas pelas ruas. Ele me disse que sim, que ali, na Avenida Paulista, 900 (prédio da Gazeta), havia uma piscina gigantesca em algum lugar do prédio na qual as pessoas nadavam despidas, completamente nuas. E que, portanto, era usual que as pessoas nas redondezas caminhassem nuas em público.
E que, ao terminarem suas aulas de natação, saiam assim, nuas, a pé, para suas casas. Fui eu mesmo conhecer a piscina e vi que era verdade. Claro que também eu comecei a nadar nu. E, ao sair da piscina e do prédio, fiz companhia para outros colegas de natação que caminhavam para todas as direções - Paulista, Joaquim Eugênio de Lima, Santos, São Carlos do Pinhal, Campinas, Brigadeiro - completamente despidos, apenas cobertos pela água da piscina que ainda escorria de seus corpos. E o sonho se resumiu a isso, apenas.
Em nenhum momento do sonho houve qualquer situação de conotação sexual, fosse desejo, um olhar sobre os corpos despidos ou algum tipo de tara. Nada disso: as pessoas que se dispersavam nuas juntavam-se aos demais transeuntes vestidos e uns e outros - pelados e vestidos - mal pareciam se notar, assim como ocorre com a multidão que se cruza na Paulista o tempo todo. Vestida, por enquanto.
Me lembrei imediatamente do sonho e, desde então, tenho recordado detalhes: a água que escorria dos cabelos do menino que encontrei primeiro, o decalque dos pés na calçada, a piscina gigante no número 900 da Paulista (aliás, um detalhe: estudei exatamente neste prédio, no 5º. andar, quando fiz a Cásper Libero), a cor esverdeada dos azulejos, a água límpida e as pessoas a tomarem elevadores com pisos apropriados e a total naturalidade em mover-se despidas.
Por isso, procurei explicações. Tenho a faculdade de me recordar dos meus sonhos com bastante frequência. E, em alguns casos, me são muito nítidos. Foi o que ocorreu. Conversei com algumas pessoas sobre isso mas ninguém me deu uma explicação aceitável.
Ontem, terça-feira, fui à fnac resolver uma dúvida com o HD portátil que adquiri recentemente e, claro, não resisti, subi as escadas e fui direto aos livros. Quando entro numa livraria, raramente sei o que quero. Mas pouquíssimas, quase nulas foram as vezes em que saí sem um livro ou diversos nas mãos.
Não foi diferente desta vez: comprei "A Educação Sentimental" - Gustave Flaubert - editora Nova Alexandria - 413 páginas -, numa edição capa dura primorosa. E já ensaiava deixar para trás os livros quando me dirigi à seção das ciências humanas - Filosofia, Psicologia, Sociologia. E é sério! Um dos primeiros livros com o qual me deparei foi "A Interpretação dos Sonhos", de Sigmund Freud.
Ainda circulei por entre as estantes antes de me decidir. Na prateleira imediatamente em frente a este livro, estava a obra completa do pai da psicanálise. Me agachei para olhar - são, talvez, uns 30 volumes, que compreendem a obra completa do psicanalista - e puxei um dos 30 ao acaso. E, sem surpresa, retirei exatamente "A Interpretação dos Sonhos", volume X (acho, não me lembro, que vai até 1900). Porque o volume XI vai de 1901 a algum ano entre 1920 e 1930.
Não havia engano. Relutei, peguei o livro (edição integral, não a edição de volumes em separado) e perguntei ao atendente se havia mais algum livro daquele disponível. Não, me disse, temos apenas este. A minha relutância se devia ao fato do livro estar com aspecto de mostruário. Certamente, outros potenciais clientes o folhearam por curiosidade e o deixaram. Entre minhas manias, está a de comprar livros o mais minimamente manipulados por outras pessoas. Quase livros virginais.
Voltei ao atendente e insisti e comparei com as edições em volumes separados. Ele me disse que aquele volume que eu tinha nas mãos era o único e integral. Satisfeito em derrubar todas as eventuais restrições que eu mesmo havia colocado, saí e me dirigi ao caixa do andar de baixo. Não sem antes comprar, ainda, a revista "Prazeres da Mesa", edição de novembro, que as tenho quase todas.
O livro que agora jaz na minha mesa - folheei repetidamente e não encontrei exatamente o significado do meu sonho - é "A Interpretação dos Sonhos" - Edição Comemorativa 100 Anos - Sigmund Freud - editora Imago - 595 páginas. Me custou R$ 115. Claro que eu já conheço o livro, cuja reputação está amplamente assentada não apenas na área de psicologia e psicanálise, mas no sentido mais amplo do conhecimento popular. Sobremaneira, as pessoas costumam relacionar com relativa frequência Freud aos sonhos. "Freud explica", dizem, quando se esquecem de dizer "Deus sabe o que faz". Portanto, o livro e teor não são desconhecidos para mim.
Desconhecido é o fato de acontecimentos circulares e sem aparente correlação terem se encadeado de forma que, agora, lerei Freud à luz do meu sonho. Ou, melhor, lerei a obra mais querida do autor (assim considerada por ele mesmo) com olhos de lince, a apurar os contornos, entornos e significados expressos ou ocultos de cada oração e parágrafo do livro em busca de respostas. Se não para o sonho que pontifica este post, para outras buscas.
Postulo, com isto - a aquisição do livro -, nada mais nada menos do que respostas que, aparentemente, o consciente não mas têm dado. Talvez o inconsciente o faça. E, se não o fizer e me deixar com as minhas constantes e inquietantes questões, ainda assim me adicionará mais repertório. Nem que seja para encher linhas de textos como essas.