Rastreio de Cozinha - 109
Pay back = pagamento de volta. Ou em quanto tempo o investimento que você fez se pagará. Pay back é um termo de negócios, de finanças, de mercado. Pay back terá que estar presente no nosso projeto do TCC. A despeito de ser fictício, o projeto é como uma tese de mestrado ou doutorado: tem como fim viabilizar-se como se um autêntico projeto fosse. E o pay back faz parte disso, como um negócio verdadeiro. E tem também o ROI (return over investment).Os TCCs podem, em muitos casos, converter-se em cases reais. Podem, efetivamente, ser a base para um projeto de abertura de um negócio. Não conheço muito bem a produção acadêmica, em geral, do mundo de finanças, de economia e de administração de empresas.
Sei que centros mais bem equipados como FGV, USP e Unicamp dão todas as bases e o impulso mercadológico para que os TCCs floresçam como embriões de negócios futuros. É assim, por exemplo, com um setor bastante movimentado na academia: as empresas de internet, as companhias de desenvolvimento de games para celulares, de jogos online e muitos outros tipos de empresas da nova economia. Nos EUA, o Vale de San Jose, na Califórnia, é pródigo em semear projetos que podem se transformar em sucessos da Nasdaq nos anos seguintes. Me refiro a empresas do nível do Google, da Apple, da Microsoft. Podem muito bem ter começado como idéias nanicas que, sob a orientação da pessoa certa (um professor articulado com o mundo), transformaram-se em sucessos empresariais. Há um monte de exemplos: Facebook, Orkut, Wikipedia etc. etc.
Mas, no nosso caso, o projeto abrange a abertura e viabilidade de um restaurante. Temos um longo roteiro para seguir até a entrega e avaliação do projeto em banca. Depois, se viável, poderíamos, caso o quiséssemos, tentar vender o projeto para eventuais investidores (acionistas). Poderíamos, ainda, desenvolver projetos equivalentes para algum investidor que queira abrir um restaurante.
Claro que o projeto atual que conduzimos é acadêmico e, portanto, não nos pertence por inteiro. É um projeto específico para a conclusão de curso e, portanto, está cercado pelas normas acadêmicas, das quais a principal é que o projeto não é comercial e, portanto, eu, sozinho, não posso tomar para mim esse projeto e assinar a autoria. Não! Os TCCs pertencem à instituição e sob esse âmbito circulam.
Se eu quiser, de fato, fazer um projeto comercial, claro que posso usar a base do meu aprendizado. Mas, terei que fazê-lo às minhas expensas, sem a orientação de professores. Porque, até onde eu sei, a estrutura da faculdade não é abrangente o bastante para gerir projetos embrionários com a perspectiva de nos lançar no mercado, inclusive com o aporte de capital de verdadeiros acionistas.
Por isso, a aplicação de conceitos como pay back e ROI, entre outros. O projeto tem que ser o mais próximo possível da realidade do mundo dos negócios. E, quando avaliamos o conjunto inteiro do TCC, verificamos o quão longe estamos do foco principal de nossos próprios projetos originais, com os quais sonhamos no início do ano passado: a cozinha e a gastronomia. Claro que se todas as pessoas tivessem a possibilidade de desenvolver projetos e verificar sua viabilidade financeira, muitas pequenas, médias e até grandes empresas sobreviveriam no mercado. Não é a regra, no entanto: a maior parte das pequenas e médias empresas morre antes de completar um ano de existência.
Agora, quando eu afirmo estar longe da gastronomia, quero dizer que estamos numa abordagem muita mais de administração de empresas, negocial e gerencial, do que da cozinha, da comida, dos cheiros, sabores, gostos e temperos. Quanto mais avançamos no TCC, mais certeza eu tenho que concatenar a moderna administração de um empreendimento como um restaurante com o trabalho duro e cru da cozinha é uma das coisas mais complicadas para uma pessoa que, como eu, tem uma outra dimensão da gastronomia.
Nunca gostei da burocracia e de todos os fatos - contábeis, financeiros, administrativos, operacionais - que fazem de uma empresa um corpo dinâmico. Agora, ao fazer a faculdade de gastronomia, também reconheço que me sinto muito melhor na cozinha do que atrás de um computador, a resolver contas, estratégias, marketing e elaborados relatos de um moderno restaurante, ainda que de forma fictícia.
Meu lugar, a princípio, é na cozinha, e não no escritório de um restaurante. Mas, eu tenho lido muito a literatura gastronômica e a maior parte dos grandes chefs têm que, necessariamente, se desdobrar entre a cozinha e a administração do negócio. Assim, como conciliar um trabalho (cozinha) com o outro (gerenciamento)?
Sinceramente, não sei. Sei que se perde, entre um compartimento (cozinha) e outro (escritório), muito da beleza que é preparar os pratos. Que a aura da cozinha perde força assim que você cruza a porta em direção ao escritório. Que a alquimia dos ingredientes jamais poderá ser repetida em meio a papéis, contas a pagar e planilhas na tela do computador.
Até cozinhar profissionalmente ficou difícil. Ou você se assume simplesmente como um cozinheiro e trabalha num lugar onde você entra e sai pela mesma porta, sem passar pelos corredores que dão para a área administrativa, ou encara a comida como negócio. Não tem jeito. É assim com qualquer profissão.
Mas, no caso específico da gastronomia, quando me vejo assim, dividido entre os botões do fogão e dos fornos e as teclas do computador, não sei se gosto do resultado final. Claro que não me é estranha a relação entre a administração e a prática da cozinha. Disso eu já sabia. O que eu não havia realizado, dentro de mim, é o quanto a cozinha me toma, a ponto de me parecer quase que impossível unir técnicas de gerenciamento com as técnicas culinárias num só caldeirão. Parece que estou a misturar erva-doce com chucrute. O resultado pode ser estranho e sem sabor. Exótico sem o correspondente "ah!" de surpresa agradável.
Mas, ainda há muito chão, muito piso a ser lavado, muito fogão a ser limpo e muita pia a ser desengordurada. Por enquanto, as ameaças gerenciais que me chegam, assim, em insights, são apenas aquelas que fazem parte do TCC. E, até o momento, me bastam. As aulas que deram origem a toda essa meditação foram de Planejamento e Organização e de Gestão Financeira. Todas as quatro aulas do dia foram de práticas gerenciais. Longe, portanto, da comida e das alquimias correlatas.
2 Comentários:
Muito importante não peder o foco daquilo que verdadeiramente gostamos. Porque também se insistimos em agir por todos os lados corremos o risco de perdermos o ritmo do que gostamos sem alcançar a outra ponta. Perdemos tico e taco.
Csdinho RoCo
Cadinho, é exatamente com esse pressuposto que sigo em frente: tenho uma meta e não quero perdê-la de foco. Abraço!
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