Só a fluoxetina acalma
Há pouco mais de um ano, no dia 1º. de janeiro de 2007, entrou em vigor a lei da cidade limpa em São Paulo. Havia mais de 10 mil painéis de publicidade em São Paulo, inclusive os gigantescos outdoors. Agora, em muitos pontos, é possível descortinar a cidade com outro olhar. Há alguns dias, um amigo da Espanha esteve em visita à cidade. Ele já conhece São Paulo de longa data, mas, a cada vez que vem para cá, ainda se choca com os postes de luz e fios da rede elétrica e de telefonia. Uma única rua (a Oscar Freire) levou adiante o projeto de soterrar os fios elétricos. Claro, é a rua mais cara da cidade e as grifes internacionais que têm lojas lá contam com um lobby fortíssimo. Tem um pequeno pedaço da Augusta que também já retirou os postes. O resultado é visível de imediato. Há uma sensação de espaço, de que há céu sobre nossas cabeças. E existe uma lei para que isso ocorra desde 2005. Mas, o custo é estimado em R$ 250 bilhões para enterrar os 180 mil Km de cabos na cidade. Com tantas prioridades na lista - esgoto, metrô, segurança, moradia - dificilmente veremos São Paulo limpa de fios e cabos aéreos. Bem, toda essa abordagem aqui é para sugerir não uma nova lei, mas um novo comportamento na cidade: o silêncio, ou o barulho limitado a decibéis que não atrapalhem as pessoas. Ainda ontem, estávamos Patty, uma maratonista com pele linda (!), o Crica´s brother e outra amiga num bar, na Vila Mariana, o Genuíno. A princípio, estávamos na área livre, descoberta, que é bem agradável. Mas, veio a chuva e tivemos que ficar num local fechado e coberto. E, quando você fecha as pessoas num lugar que elas, espontaneamente, não escolheram, alguns (como eu) tendem a sair do estado humano e ir ao estado de natureza pura, primitiva. Estávamos nós numa mesa, dois caras ao lado, outros dois atrás e uma mesa com umas seis ou sete gralhas que grasnavam agitadas, mais histéricas do que o mar de Peruíbe no último fim de semana. Elas estavam ao fundo, mas, parecia que estavam num palco de boteco, tal o barulho que fizeram durante todo o tempo em que lá estivemos. Não sou bom calculista, mas, na minha contagem, produziram o equivalente a uma banda que tocou no último Nokia Trends, algo assim como uns 5 mil decibéis. Eram gritos, palavrões, berros, risadas, gargalhadas e, sobretudo, uns sons guturais produzidos por animais como vacas, galinhas, emas, iguanas, pererecas, guaximins, macacos-prego e zebras e outros estranhos que habitam apenas a Nova Zelândia como o dingo, o diabo da Tasmânia e o ornitorrinco. Foi tanto barulho que eu, tão tolerante quanto a lei de tolerância zero de Nova York, perdi todo o ânimo. E quando isso ocorre, eu fico inanimado feito uma pedra. Minério puro! Não tenho vontade de falar e deixo de sociabilizar. Viro bicho para me equiparar à fauna. O resultado é que saí de lá com dor de cabeça, irritado. Não acho que dá para fazer uma lei que obrigue as pessoas a serem cordatas. Mas, que falta faz a falta de educação! Na Alemanha, em Leipzig, uma amiga que morou lá me disse que havia uma lei municipal pela qual, após as 22 horas, era proibido usar a descarga nos prédios de apartamentos. Quem o fizesse, seria multado! É exagero? É! Por outro lado, no ano passado, acima e abaixo de mim (moro no 9º. andar), houve sete ou oito reformas de apartamentos, com paredes quebradas, marteladas ao longo do dia (das 9 às 17 horas) e pedaços de cimento que caem a toda hora. Agora, neste instante, há uma reforma em curso no 10º. andar. Quando eu falo ao telefone, as pessoas ouvem. Duvido que é assim na Europa, com todo esse barulho. Se eu fosse inventor, inventaria um saco de recolher barulho para reduzir o nível de ruídos de São Paulo. A cidade, que ganhou muito com a despoluição visual, teria outra face (e ouvidos) se diminuísse a poluição sonora. Eu me lembro de ter lido uma moradora de rua dizer, num jornal, que morava sob um viaduto porque o barulho dos automóveis que passavam acima de sua cabeça era o único som que reduzia o barulho interior que o seu próprio cérebro produzia. Bem, no caso, era sinal de loucura. Mas, eu não tenho barulho interior (quer dizer, só um pouquinho, que se resolve com fluoxetina - Daforin, Deprax, Depress, Digassim, Eufor 20, Fludac, Fluxene, Fontex, Foxetin, Lovan, Neo Fluxetin, Nortec, Prodep, Prozac, Prozen, Psipac, Psiquial, Sarafem, Selectus, Symbyax, VerotinaFluctin; Nossa! Será que exagerei na dose????). Ou o barulho diminui ou o monstro bipolar irá do Pólo Norte ao Sul sem escalas!!! Grrrraaaannnnnn!!!!
5 Comentários:
Sério mesmo que fluoxetina resolve alguma coisa? Acho que eu sou a única pessoa que ODEIA esse remédio! rs
Enfim, de São Paulo eu não entendo nada, pois só estive aí duas vezes (na adolescência e ano passado) mas de gente barulhenta, ah, meu filho, disso eu entendo!
E ABOMINO! Por que vocês não pedem para o prefeito daí proibir as pessoas que falam alto demais de abrirem suas bocas? Sei lá, ele é doido mesmo, vai que cola?
O que importa é que essas pessoas são insuportáveis e tiram o humor de qualquer um, não só o seu. Até que você foi muito educado, eu seria bem mais agressiva! rs
Vc foi de um pólo a outro no seu próprio texto, camarada. Foi da limpeza (percebida pela visão) até o barulho (percebido pela audição).
Metalinguagem, sinestesia, metáfora, ironia.
elementos que a literatura usa e dos quais, às vezes, abusa.
E sua indignação quanto às falantes de botequim foi válida.
E hilária.
Valeu.
Red, eu me acho até tolerante... porém algo que me incomoda (e muuuito) são pessoas que falam muito alto, ODEIO!!! O pior é quando acham que falar alto poderá ajudar a valer a opinião... Não suporto... mas nem fluoxetina resolve! rs
Beijos
Mara
Mahyba, note que listei 21 tipos de fluoxetina, praticamente um para cada dia útil do mês. E nem assim dou conta!
blog, obrigado. talvez a literatura seja muito mais bipolar do que eu imaginava.
Mara, às vezes, só o cianureto. beijo!
Por um momento, pensei que falaria sobre os "gritos emitidos pelas girafas" também... :P
Um abraço!
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