Contatos imediatos de primeiro grau
Passei quase quatro anos isolado num local em que chamava "torre". Como se fosse eu um Barba Azul, sem as respectivas vítimas (devo tê-las feito, ao longo desse período, mas não de forma direta como fazia Barba Azul), me isolei nas alturas do nono andar e me encerrei, numa fuga talvez motivada pelo cansaço da rotina jornalística e por falta de sentido. Nesse meio tempo, fiz uma faculdade inteira: me graduei chef de cozinha. A prática não a tenho, mas a técnica e a boa literatura gastronômica me abriram um novo mundo que eu intuía. Ainda não sei as consequências da faculdade de gastronomia na minha vida. Mas, a guardo em escaninho dileto, para dali sacar, talvez, um horizonte que, por ora, não suspeito.
Depois desses quase quatro anos, voltei, em abril deste ano, ao ambiente de uma redação. Voltei ressabiado, duvidoso da profissão em si e do meu próprio destino. Depois de 8 meses, devo dizer que pertenço, sim, à redação. Que, aos contatos virtuais feitos ao longo dos quatro anos, fiz, este ano, vários contatos imediatos de primeiro grau.
Sem falsa modéstia, domino a técnica jornalística e faço uso completo da minha melhor empunhadura, que é a palavra escrita. As palavras, de mim, costumam sair como se eu as lavrasse na terra. Sou a terra e a enxada, a semente e água da chuva que, juntas, fecundam os textos. Pode parecer romântico ao olhar alheio, alheio ao que se me vai dentro, mas, asseguro, as palavras, em mim, ainda que profissionalmente, reverberam e encontram terreno fértil.
Creio que, ao voltar ao convívio diário da redação, retomei alguns pontos que estavam eclipsados por outros interesses, por outras visões. Equivocadas talvez. Ou não. Quero acreditar que as pessoas que conheci ao longo do ano, a maior parte delas, não são colegas de profissão. São pessoas, algumas sobretudo, que as terei comigo para sempre. Tenho novos amigos, novas ideias, novas faces, novos olhares sobre a vida.
Ao mesmo tempo em que me voltei para a vida real, física, presencial, a minha presença neste espaço que me é tão querido se distendeu. Muitas noites tive ímpetos de escrever mais um post, crispar neste blog as agruras, reais ou não. Me refreei mais por cansaço do que por temor. Nunca temi publicar nada neste blog. Me confesso, me jogo, me atiro daqui desta janela virtual para o vazio. Sempre tive a consciência do eco que reverbera de volta.
De forma que, se amigos reais contabilizei este ano, amigos virtuais ficaram relegados. O que lamento. É o cotidiano contemporâneo que atropela vidas real e virtual. Tenho tido, ao longo do tempo da existência deste blog - pouco mais de três anos - experiências as mais ímpares. Algumas pessoas vieram e se foram. Outras chegaram e se instalaram no meu coração. Outras estão em suspenso, tal qual as palavras que as telas dos computadores estampam. Se lamento a ausência compulsória deste blog, não posso deixar de me alegrar aos(às) resistentes amigos(as) virtuais que me resgatam. Aos comentaristas que nunca arrefeceram ante meu silêncio. Aos que romperam, inclusive, o silêncio.
Portanto, celebro este ano heterodoxo em que ganhei pessoas reais na minha vida real. E também a manutenção das pessoas no ambiente virtual. Algumas, quase as conheço, de tão vívidas. Outras, são um lampejo, se deixam ver apenas o contorno. Assim como eu mesmo devo refletir várias tonalidades.
Chega agora o tempo que eu chamo de período das aves migratórias. Me vou, uma vez mais, para os meus. Estive com a minha família há sete meses e isso é tempo demais na cronologia desses anos que correm céleres.
Me afasto da vida real da redação, de São Paulo, e me aproximo da vida real da minha família, do novo (há um bebê, de 10 meses), do precedente (há uma avó, de quase 90 anos) e do conhecido, conhecidíssimo universo do qual eu vim. Me vou de novo, empreendo a migração sazonal. Pelos próximos 15 dias, torno-me invisível neste blog. Descanso eu e descanso você de mim.
Não falarei palavras doces sobre o dia de amanhã porque tenho sérios conflitos em relação a esta data. Mas, te desejo, expressamente, que amanhã e os próximos dias, semanas, meses e ano sejam do jeitinho que você queria. Seja em reuniões familiares, como é o meu caso, seja na balada, com os amigos, na praia, no exterior, na rua. Que seja apenas da forma, ou o mais próximo da forma, que você idealizou. E já será o bastante. Falamo-nos em 2011. Um lindo e ousado 2011 para você. Beijo!
P.S. Deixei este post em modo de publicação automática. Ou seja, quando for postado, estarei bem longe, ainda na estrada, mas longe da tela do computador. Peço desculpas pela saída à francesa, mas o fato é que não gosto muito de despedidas.